Por Pedro Dutra Fonseca, professor titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFRGS
Há 90 anos, ao final de outubro de 1929, a bolsa de Nova York quebrou. A notícia não alterou o cotidiano de Porto Alegre, que parecia crer que não seria afetada. O Rio Grande não era um polo exportador, São Paulo seria mais prejudicado. E isso poderia até ajudar no assunto dominante: a candidatura de Getulio Vargas à Presidência, já com apoio de Minas e Paraíba, que indicara o vice João Pessoa. Até a aliança com oposicionista Partido Libertador já era façanha sem novidade.
Ninguém tinha clara dimensão dos fatos: afinal, bolsas caem e sobem todos os dias. Vargas diria: "O alarme dos cafeeiros é uma crise passageira de gente rica, que vê seus lucros diminuídos. Não nos iludamos com as aparências". Há décadas o café passava por crises e o estoque já era superior à demanda internacional de um ano. O país arcava com o custo, financiado por empréstimos externos, mas São Paulo acreditava que era uma locomotiva que puxava 20 vagões vazios.
Tais recursos cessariam, pois os bancos americanos e ingleses faliam em efeito dominó, e em seis meses o preço do café era 10% de antes da crise. A indústria, a pecuária e agricultura voltadas para o mercado interno – como as gaúchas – seriam a nova locomotiva? Mas a demanda do centro do país em queda acabou afetando os produtos locais. Os bancos Popular e Pelotense, com problemas há vários anos, faliram. As sedes faraônicas do último – marketing de sua pujança – agora eram um ativo imobilizado. A crise exigia liquidez e não patrimônio, e na mesma situação estavam os fazendeiros cujas dívidas eram garantidas com gado e terra, também ora desvalorizados.
Aos gaúchos, a crise inicialmente parecia longínqua: o que ocorria com o café, com a pecuária, com o banco, com a candidatura... nada era novidade. Mas os acontecimentos se aceleraram e desfechos sonhados ganhavam viabilidade. Até já se comentava que, se a eleição fosse "roubada", a saída seria a revolução: afinal, por que Oswaldo Aranha, Secretário de Estado do Interior, importara armas do Canadá e da Tchecoslováquia? O mundo mergulhava numa depressão sem precedentes, mas no Estado o Réveillon foi comemorado com festas: a sensação é que agora chegara "a nossa vez". Antídoto ao pessimismo, só a política é capaz de trazer esperança nas crises. Claro, os políticos também eram outros.