É inoportuna a decisão do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RS) de repassar a servidores do órgão supostas diferenças nos ganhos referentes ainda ao período que antecedeu a criação do real, em meados dos anos 1990. Do TCE, a sociedade gaúcha espera que se preocupe em zelar permanentemente pelo rigor na destinação de recursos públicos, sempre com o máximo de transparência, não atitudes que impliquem ainda mais despesas para a máquina administrativa. No caso atual, se a intenção for mantida, o custo para um poder público que já não consegue cumprir compromissos rotineiros com os cidadãos será milionário.
O agravante é que a decisão tomada agora pode inclusive provocar um efeito cascata nos vencimentos de outros servidores. As consequências nas contas públicas seriam explosivas. Só no Tribunal de Contas gaúcho, o custo adicional pode alcançar R$ 232,5 milhões. Se a medida for estendida ao Legislativo, do qual o órgão faz parte, o total seria ampliado em mais R$ 600 milhões. E já há pressões por parte de funcionários da Assembleia nesse sentido.
Um impacto tão expressivo nas contas oficiais só foi possível porque, no início do mês, ao analisar recurso da associação de funcionários aposentados, conselheiros do órgão reavaliaram decisão anterior, que havia considerado as diferenças prescritas. A alegação foi a de que os créditos não estavam sem possibilidade legal de cobrança, como havia determinado anteriormente a direção-geral da instituição, em duas ocasiões. A mudança de posicionamento foi uma consequência da pressão dos servidores, que não aceitavam o entendimento anterior.
Fica difícil para a sociedade gaúcha entender que, em meio à crise do setor público, categorias de servidores decidam buscar alternativas num passado remoto para reforçar seus ganhos. A decisão do TCE é incompatível com a situação das finanças do Estado, que mantém servidores com seus salários em atraso há mais de 30 meses no Executivo e está em débito com fornecedores. Na prática, reforça as vozes que defendem um controle externo sobre a instituição.
Alegações de representantes do TCE como a de que não haverá impacto financeiro com a decisão porque o pagamento será feito de forma parcelada, ao longo dos anos, não servem de atenuante. O dinheiro, que é dos contribuintes, sairá igual dos cofres públicos. O setor público gaúcho não terá como resolver a crise que o imobilizou enquanto não contar com a contribuição de todos os poderes e de seus órgãos auxiliares.