Por Eduardo K. M. Carrion, professor titular de Direito Constitucional de UFRGS e da Fundação Escola Superior do Ministério Público do RS (FMP)
Modus in rebus. Numa tradução livre: "Para tudo deve haver moderação". O quinto constitucional, ou seja, a indicação, pela advocacia e pelo Ministério Público, de membros para compor tribunais, regra inscrita na Constituição, tem sido alvo de intensas discussões. O bom senso sugere, antes de tudo, que o debate não seja contaminado pelas circunstâncias do momento.
O objetivo da regra seria, pelo visto, trazer aos tribunais sensibilidades ou olhares complementares, que não exclusivos da magistratura de carreira, enriquecendo assim a cultura e a diversidade dos mesmos tribunais, em benefício da sociedade, que é igualmente diversa. Mas sempre, espera-se, tendo como referencial a Constituição, sobretudo, e as leis, sem que isso precise significar mera literalidade. O trabalho de interpretação/aplicação da lei não se equipara simplesmente a um silogismo, em que a lei faça o papel de premissa maior, o caso concreto, de premissa menor, e a sentença, de conclusão do silogismo. Se esse fosse o caso, bastariam os computadores e a pura ou pretensa racionalidade deles – e tudo estaria resolvido, para o melhor ou para o pior dos mundos. Mas seria talvez desconhecer a dinâmica da natureza humana, contraditória na sua riqueza, em que vale tanto o "cogito, ergo sum" (penso, logo existo), de Descartes, quanto o "volo, ergo sum" (desejo, sinto, quero, logo existo), de Maine de Biran.
Muitas vezes uma ideia originariamente razoável e rica pode dar margem a equívocos, a desvios, a erros mesmo. O instituto do quinto constitucional, para prosperar positivamente, deve cada vez mais incorporar, na escolha, critérios que o qualifiquem permanentemente. Demais, não deve ser passível de interesses meramente corporativos ou inconfessáveis.
Algo importante a destacar: as consequências políticas, máxime em matéria constitucional, de uma decisão judicial não devem excluir sua apreciação (seu conhecimento) jurídica, nem desnaturar a lógica jurídica da decisão judicial, a partir de critérios singularmente políticos, sob pena de uma indevida politização da atividade judicial, no sentido da perda dos referenciais e dos paradigmas jurídicos. Nem sempre a exposição demasiada junto aos meios de comunicação de membros do Judiciário, entre outras coisas, tem contribuído para a imagem de isenção, e de serenidade, que deve ser a do Poder Judiciário.
O atual clima de polarização política do país tem sido pródigo no acirramento das diferenças, na inviabilização das convergências, na prevalência das paixões, no obscurecimento da razão, contaminando por vezes setores do Judiciário e a própria imagem que se faz do Judiciário. Assim, dependendo da circunstância, o quinto constitucional pode ser, como a língua de Esopo, tanto a melhor como a pior das coisas.