É certo que a polícia descobriu quem sequestrou, estuprou e matou Naiara. Mas a reportagem de ZH (24/25/03) mostra quem foi responsável por sua morte.
Aliás, Naiara sequer merecia ter nascido. Foi a 8ª filha de uma mãe que , pela negligência com que tratava os filhos, há um ano já era acompanhada pelo Conselho Tutelar. Viciada em crack, os deixava na rua, com fome. Depois de quatro anos, em 2014, sete dos filhos foram levados para um abrigo. Durante um mês Naiara e dois irmãos ficaram com a avó materna, que os devolveu e não foram mais procurados por nenhum familiar.
Tudo isso aconteceu em Vacaria. Mas descobriu-se uma tia paterna que residia em Caxias. Morava em uma casa de quatro peças com cinco filhos e aceitou ficar com três sobrinhos. Desempregada, recebia R$ 400,00: a pensão das crianças pela morte do pai. Todos reconhecem que ela teria direito a outros benefícios, mas faltou comunicação e sobrou burocracia entre os órgãos de proteção. Sequer a justiça de Vacaria comunicou a Caxias que as crianças haviam sido transferidas para lá.
Esta situação permaneceu por três anos, até que aconteceu o que aconteceu. Uma tragédia anunciada. Com sete anos, Naiara ia sozinha para o colégio. Nem a tia, nem a escola e nem o conselho tutelar sabiam disso.
Por que houve o descumprimento da lei que admite somente a entrega à família extensa?
Assim, cabe questionar. Qual seria o futuro de Naiara e de seus irmãos se, ao ser constatado que a mãe, por ser dependente de drogas, deixava os filhos abandonados, tivesse o Estado cumprido o seu papel: assegurar-lhes proteção integral e convivência familiar , como garante a Constituição da República? Como eles foram parar a 100 quilômetros, com uma tia paterna, que já tinha cinco filhos, e sem qualquer acompanhamento? Por que houve o descumprimento da lei que admite somente a entrega à família extensa: parente com quem a criança convive e mantém vínculo de afinidade e afetividade (ECA, art. 25 § 2º)?
Qual o destino dos sete filhos de Naninha, se não tivessem ficado abrigados por três anos? Se não fossem entregues a quem não era sua família extensa? Se a Justiça tivesse sido mais célere em disponibilizá-los à adoção?
Certamente Naiara não estaria morta.