O projeto de lei do Senado que prevê a regulamentação do inciso III do § 1° do Artigo 41 de nossa Constituição, na forma do substitutivo apresentado pelo seu relator, o senador gaúcho Lasier Martins, é um perfeito instrumento facilitador da redução do Estado Social, e não de aprimoramento do serviço público. O texto, que visa à perda do cargo público por insuficiência de desempenho do servidor, estabelece um regramento dessa matéria que, se implementado, forçará a criação de uma infraestrutura burocrática consumidora de um esforço apreciável. E o próprio servidor, sabedor de que terá que ser submetido anualmente a uma avaliação que pode determinar sua demissão, dificilmente se sentirá confortável no ambiente de trabalho. E estamos, aqui, tratando do servidor concursado que já cumpriu os três anos de estágio probatório, que por mérito ingressou em uma carreira onde já estão presentes instrumentos avaliativos, a cada episódio de ascensão na carreira, motor maior do estímulo ao bom desempenho, e igualmente garantia de crescimento profissional.
Os que ensinam em uma sociedade livre não podem ser amordaçados pela ideologia do poder, que é apenas de uma parte da sociedade.
A estabilidade dos servidores é garantia de que o serviço público não será tutelado e pautado por interesses dos governantes de momento e de organizações particulares. Também, nada garante que o regramento proposto possa impedir demissões por vingança, inveja, inimizade. Aqueles que exercem funções de fiscalização, de magistratura, de educador, necessitam da garantia da estabilidade para exercer o seu papel público de averiguar irregularidades, julgar litígios, formar a cidadania crítica.
Imagine-se a fragilidade das relações que se estabelecerão nos pequenos municípios das regiões mais afastadas do país, onde fiscais e professores, por exemplo, ficarão totalmente à mercê da pressão de grupos políticos dominantes. Em uma terra de arranjos políticos imorais, retaliações e acertos de contas obscuros, o serviço público não pode ser desestabilizado pelas mudanças de governo a cada ciclo eleitoral, com as consequentes mudanças de chefias e direções, que em última análise são as instâncias que serão incumbidas de fazer as avaliações.
No caso específico dos professores, é fundamental nos referirmos à liberdade de cátedra, que é um princípio da modernidade democrática. Os que ensinam em uma sociedade livre não podem ser amordaçados pela ideologia do poder, que é apenas de uma parte da sociedade. A liberdade de ensinar e aprender é fundamental para a construção da cidadania crítica e transformadora, necessária para a elevação da consciência. Sociedade que tutela e ameaça a liberdade dos professores, como fará esse projeto de demissão por uma avaliação de desempenho mais do que suspeita, é sociedade escravocrata e autoritária.
A estabilidade dos servidores públicos em um ambiente democrático, moral, impessoal e legal é fundamental para a garantia das liberdades civis e para a defesa da sociedade contra a tirania.