É salutar para o país que o todo poderoso ex-ministro Antonio Palocci tenha decidido contar o que alega saber sobre relações altamente promíscuas entre governos petistas e empresas privadas com interesses comerciais no setor público, com destaque para a Odebrecht. O ex-ministro é o primeiro integrante do núcleo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a romper o código de honra mantido entre próceres do PT, semelhante à omertá da máfia italiana. O episódio se constitui em muito mais do que um caso típico de fogo amigo. A detalhada narrativa do que o diz ter visto e ouvido durante seu longo período como protagonista dos governos de Lula, como ministro da Fazenda, e Dilma Rousseff, como chefe da Casa Civil, constitui-se num verdadeiro bombardeio de efeitos explosivos. No devido tempo, é preciso que a população seja esclarecida sobre a verdade dos fatos, para que não venham a se repetir.
Naturalmente, depoimentos de candidatos a acordos de delação premiada, como o do ex-ministro, têm de ser encarados com ressalvas. Mas, neste caso, há muito mais em jogo do que o interesse em vantagens perante o Judiciário por parte de um político preso há um ano e condenado a 12 por corrupção e lavagem de dinheiro. O que choca são os detalhes da confissão de alguém que conviveu com a intimidade e partilhou das decisões dos ex-mandatários petistas.
Essa particularidade torna mais difícil para o ex-presidente Lula e suas correias de transmissão persistirem na estratégia de sempre: a desqualificação de quem o denuncia. No caso, a alegação de um membro expressivo das gestões petistas é de que o ex-presidente teria avalizado um "pacto de sangue" pelo qual a Odebrecht se comprometeria a arcar com um "pacote de propinas". O objetivo seria assegurar espaço no período de troca de governo entre dirigentes do partido. O mínimo que precisa ocorrer a partir daí é uma mudança radical na estratégia da defesa.
Será cada vez mais difícil para os militantes continuarem insistindo na narrativa da criminalização ou da perseguição política. O PT, Lula e Dilma terão agora de encontrar outra justificativa para reduzir o impacto das acusações formuladas por seu influente ex-ministro.
A usual alegação de perseguição da imprensa, combinada com o Judiciário, é uma delirante teoria da conspiração que essa figura-chave dos governos petistas colocou por terra no seu devastador depoimento ao juiz Sergio Moro, responsável pela Operação Lava-Jato em Curitiba. Antonio Palocci é apenas o primeiro, entre seus correligionários, a romper o silêncio e, como se viu, tem muito mais a falar.