* Advogada, vice-presidente do IBDFAM, presidente da Comissão da Diversidade Sexual e Gênero da OAB
A sociedade sempre tentou, sem sucesso, engessar a forma de as pessoas viverem e amarem. Esta resistência – historicamente e ainda hoje – é acompanhada pelo legislador, que tem enorme resistência em flexibilizar esse naco do Direito que diz com relações interpessoais, no âmbito privado.
Mas de nada adiantou várias Constituições proclamarem que o casamento era indissolúvel. Isto nunca foi verdadeiro. Apesar de, por décadas, a lei punir quem ousasse descumprir os deveres matrimoniais; se relacionasse com uma pessoa casada e até quem era fruto de um relacionamento extraconjugal. Tais interdições, mesmo produzindo severas injustiças, não dissuadiram ninguém de buscar a felicidade que não mais encontrava junto ao seu cônjuge. Afinal, não há mesmo motivo para alguém se submeter ao significado etimológico da expressão "cônjuge", que vem do latim "cum jugo": peça de madeira ou arreio que mantém juntos os bois que puxam uma carroça.
Não há – e nunca houve – como obrigar os noivos a cumprirem a promessa feita no altar de permanecerem juntos na pobreza, na tristeza e na doença, até que a morte os separe!
Antes do divórcio, havia o desquite, figura que mudou de nome, mas manteve o mesmo conceito. O desquite e a separação rompiam, mas não dissolviam o vínculo do casamento. Ambos desobrigavam o cumprimento dos deveres matrimoniais, sem, no entanto, permitir novo casamento. Sabe-se lá qual o significado da mantença dessa distinção por tanto tempo, que, felizmente, acabou com a Emenda Constitucional 66/2010. Apesar de algumas resistências isoladas, a separação está mesmo sepultada e enterrada.
A rigidez legal e o conservadorismo social foram atropelados quando do avanço dos direitos humanos, que priorizaram a qualidade de vida das pessoas.
Ninguém duvida que o grande legado do IBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de Família – foi desatrelar o conceito de família da instituição do casamento. É sua a responsabilidade pelo primado da afetividade como elemento identificador das relações interpessoais.