Leonel Brizola daria um grande youtuber. Se Brizola, com aquele dedo em riste e o olhar que penetrava da retina à nuca, mandasse você comer batata-doce e parar de matar a academia, você teria a barriga da Gabriela Pugliesi. O velho Briza, que também era um profundo conhecedor do eleitorado brasileiro, percebeu um perigoso movimento migratório. Por isso aquela sua fala exasperada para a câmera no debate de 1989:
– Se você quiser. Se essa for a tua consciência, não vota no Leonel Brizola. Aí, há gente digna. Competindo honestamente. Mas não vota nesses candidatos!
Brizola se referia a Fernando Collor e Silvio Santos, cuja candidatura nem vingou, mas que vai nos servir aqui para outra coisa. Porque a melhor forma de entender como vota o brasileiro é lembrar de um antigo programa dele chamado Tentação. Funcionava assim: era feita uma pergunta e três portas se abriam com uma resposta correta e duas erradas. A multidão escolhia para qual delas caminhar. Por convicção ou por convicção na convicção dos outros.
Imagine a cabeça de um participante: "Qual destes vegetais não é um fruto? Porta 1: tomate. 2: morango. 3: cereja". Ele se recorda bem da pegadinha na prova de biologia: morango não é fruto. Então, caminha resoluto até a porta 2. E, atentos ao seu passo seguro, outros 20 o seguem. Mas ali no tomate está um rapaz de óculos e camisa de botão. Ao lado daquela figura serena, ele começa a pensar na ausência do tomate na salada de frutas. No iogurte de frutas vermelhas com cereja, framboesa e... morango. Quando olha em volta, 17 dos seus 20 acompanhantes já migraram para o tomate. Restam ele e outros três. Nenhum de óculos. "Ai meu Deus, onde estou com a cabeça!" Nos últimos segundos, ele corre para a porta 1. A do tomate. Que é um fruto.
Collor se elegeu dessa forma. Muitos votaram nele não por convicção na escolha, mas porque outros tantos eleitores o escolheram antes. Pensei nisso quando João Doria tomou uma ovada em Salvador, na segunda passada. O estalo no cabelo lambido do tucano foi o primeiro indício de que o pré-candidato se precipitou. Abriu sua porta cedo demais e já se transformou em alvo. A migração dela está prestes a começar.
Para adivinhar qual candidato vai vencer em 2018, eu não olharia para as portas já abertas: Lula, Bolsonaro ou Doria. Olharia para os muito quietos. Para quem ainda não abriu sua porta, pois sabe que é cedo demais.
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