Sob o clima de radicalismo político instalado no país, pode parecer difícil dissociar a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva do passionalismo que costuma cercar tanto a imagem do candidato mais citado às eleições presidenciais de 2018 quanto a do juiz federal de primeira instância Sergio Moro. Ainda assim, a inédita condenação na esfera penal de um ex-presidente da República sob a acusação de ter recebido propina precisa ser vista de forma menos emocional. É importante que seja encarada mais como consequência natural de um processo de amadurecimento contínuo de combate à corrupção no país.
A primeira sentença das cinco ações penais em andamento contra o ex-presidente, referente a favores que teriam sido prestados pela OAS no caso do icônico triplex em Guarujá (SP), não tem como se prestar também como reforço de teses conspiratórias. O responsável pela Operação Lava-Jato em Curitiba demorou mais do que o habitual, preparando uma sentença dura mas baseada nos fatos amplamente apurados. Ainda é uma incógnita se Lula será ou não candidato, mas o TRF4 tem se mostrado rápido e certeiro nas suas decisões em segunda instância. De qualquer forma, os danos à imagem do líder político e a seu partido, o PT, que surgiu associado à ética, são incalculáveis. É lastimável ver a reação de petistas, que aplaudem as condenações de adversários e veem conspiração na de seus líderes.
A decisão tornada pública ontem está longe de se revelar um caso isolado, no momento em que políticos de quase todos os grandes partidos enfrentam o rigor da lei. Como alega Sergio Moro, "é de todo lamentável que um ex-presidente da República seja condenado criminalmente". Só há justiça, porém, quando a lei vale para todos. O próprio presidente Michel Temer foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República sob acusação de corrupção passiva no âmbito da delação da JBS. Por mais que casos assim desgastem a imagem dos políticos e do próprio país, o aspecto promissor é que as instituições funcionam, agindo no cumprimento de seu papel. A Justiça não pode se dobrar a pressões de quem quer que seja. Independência do Judiciário é fundamental para a democracia.
No caso do dirigente petista, essa é apenas a primeira etapa de um processo que tende a se estender pelo tempo. Ainda assim, a decisão do juiz Sergio Moro precisa servir de reflexão, entre aliados e opositores do ex-presidente, sobre até onde podem ir as consequências quando políticos insistem em confundir os limites entre o que é público e o que é privado. Que a justiça seja feita, sem intimidação contra juízes e imprensa, em nome da democracia.