Um dia ainda escreverei um guia de estilo, não de moda, claro, mas de retórica, recolhendo figuras clássicas e acrescendo algumas novidades à lista. Uma destas será o argumento ad senectutem, à velhice, não como fonte de autoridade, tal ocorre no ad verecundiam, mas como ferramenta que revele a idade do orador.
Poderá ser usado, como todos os golpes verbais desde os gregos, para ataque ou defesa. No entanto, meu principal alerta será para o uso inocente, aquele que envelhece quem argumenta sem que se o perceba, como no caso de "na minha juventude".
Na minha juventude já nos faz cravar uns sessenta anos em seu usuário, como naqueles testes de televisão em que passantes são chamados a avaliar qual a idade de uma vítima dentro de uma cabine por seu degenerado aspecto físico, antes que algum fisicultor a possa salvar com torturantes dietas e corridas funcionais dentro de matas bravias ou penhascos escarpados.
De todo modo, enquanto perco fortunas por não escrever meu imprescindível e insofismável guia, peço licença para, aos meus 41, dizer: Na minha juventude. Pois lá eu costumava carregar sempre um livro nas mãos, em geral um dos russos, e quem já se entregou às delícias do eslavismo, em qualquer tempo, sabe que os romances tendem a ser mais robustos do que o desejado, em outras palavras, é difícil não passar por alguém de igreja carregando um Tolstoi ou um Dostoiévski. Talvez fosse mesmo uma religião da minha juventude, e que perigosa religião.
Não sei por que não usava uma mochila, mas depois de algumas chuvas inesperadas, pensei num produto que fosse uma cobertura impermeável para as obras. Destruí um daqueles arquivos pretos, de plástico áspero, e improvisei uma capa com encaixes para as lombadas. Vejam, tudo isso muito antes dos motoboy se protegerem à mesma maneira.
Quis ser músico, tradutor, professor e poeta. Entendo o desespero da família. Considerem quantas divisas perdidas para o estado. Isso que nem mencionei a minha genial ideia de aromatizar a água dos limpadores de para-brisa com fragrâncias importadas, que entrariam pelo sistema de ar. Depois a crise é culpa dos governos.