Ainda que controversas, no geral as delações premiadas têm se configurado em elemento fundamental para o avanço da faxina ética do país. No entanto, há justificados clamores de indignação da sociedade diante dos termos do acordo que consagrou a impunidade de Joesley Batista, um dos donos da JBS, conglomerado erguido sobre os alicerces da corrupção e da promiscuidade com o poder público.
Já havia questionamentos sobre delatores desfilando suas tornozeleiras por refúgios dourados. Agora, destampou-se um amplo desconforto com o fato de a punição a Joesley limitar-se ao pagamento de uma multa irrisória para o tamanho do patrimônio que acumulou ilicitamente e, com isso, ser autorizado a deixar o país rumo a seu exílio em Nova York, legando um rastro nunca antes visto de corrupção e a maior crise política da história recente do Brasil.
Com o beneplácito da Procuradoria-Geral da República, Joesley viajou tranquilamente em seu jato particular e deixou para trás inúmeras dúvidas e respostas não esclarecidas em seus depoimentos. Entre elas, está o súbito esquecimento do nome dos cinco deputados que teria comprado por intermédio de João Bacelar (PR-BA) para que votassem contra o impeachment de Dilma Rousseff. Todos os nomes dos parlamentares, que entregaram devidamente a mercadoria, precisam vir à tona para que o grupo de vendilhões seja devidamente processado e cassado.
Não menos inquietante são as evidências de que a JBS faturou alto com a crise, vendendo ações antes de que, previsivelmente, despencassem quando a delação se tornasse pública. A JBS foi mais além, com evidências de que efetuou uma compra bilionária de dólares na véspera da inevitável disparada da cotação desencadeada pelo terremoto no Planalto.
Só essa manobra de inside trading, inaceitável em qualquer país com regras minimamente decentes, seria suficiente para rever os beneplácitos concedidos a Joesley e remetê-lo à senda da Justiça de Curitiba. A Procuradoria-Geral da República, aliás, ainda precisa explicar, com transparência, como e por que concordou com tamanho favorecimento a quem já se caracteriza como um dos maiores distribuidores de propinas da história mundial.
Se há um ponto certeiro no discurso de sábado do presidente Michel Temer, é o de que Joesley praticou um crime perfeito. Corromper como ele corrompeu e sair livre e ainda mais rico é uma mancha na operação que pretende passar a limpo o Brasil. Tal evidência, porém, não exime em nada a condição de Temer. Ao contrário, torna ainda mais evidente e inadequada a relação promíscua que o chefe da nação mantinha com o líder do conglomerado que cobriu com o manto da corrupção grande parte do poder político nacional.