* Arquiteto e urbanista
Lembra aquela loja perto da parada de ônibus? Fechou. E aquela padaria em que você sempre passava antes de ir para casa? Não existe mais. Comércio de rua tornou-se artigo tão raro quanto gente caminhando na calçada. A cada ponto comercial que encerra suas atividades, perde-se não só um serviço ou atividade que tornava a rotina mais prática, mas também os "olhos da rua", citando a urbanista Jane Jacobs, autora do consagrado livro Morte e Vida das Grandes Cidades. Fato é que a presença do outro – neste caso, do proprietário e do cliente – dá a certeza de um lugar habitado e, por isso, seguro.
O fenômeno das placas de "aluga-se" e das grades baixas pode ser consequência da crise econômica. Mas, verdade seja dita, é também resultado de um ciclo causado por falta de planejamento urbano: as lojas fecham porque tem pouca gente na rua e tem pouca gente na rua porque as lojas estão fechadas. A mistura de usos – espaços comerciais, escritórios e residências – enriquece a cidade. Durante o dia, há movimento de quem trabalha. À noite, de quem volta para casa. Forma-se, então, uma comunidade mais ativa.
Não à toa, diversos municípios ao redor do mundo – como apresentado durante a Habitat III, conferência das Nações Unidas sobre moradia e desenvolvimento urbano sustentável – apropriam-se das relações de comunidade com seu bairro para fazer transformações nas políticas urbanas, leis e incentivos ao uso misto da cidade.
Não é preciso ir muito longe para encontrar bons exemplos. No Bom Fim, bairro tradicional de Porto Alegre, a feira leva a vizinhança para a rua, é possível notar a conversa na fila do pão, o dono do mercadinho é chamado pelo apelido e os próprios comerciantes se reúnem para ações de ativação. É preciso dar força ao comércio. Mas também é urgente incentivar um urbanismo que proporcione a aproximação das pessoas. O uso misto dos bairros, discussão que deve ser mais e mais presente, é ferramenta fundamental se realmente queremos melhores cidades. Pois é isso que dá vida à rua e movimenta a circulação de pedestres. O trabalho do arquiteto é essencial para o planejamento urbano.