"Tentaram me criminalizar para me intimidar." A declaração do jornalista Reinaldo Azevedo ao programa Timeline, da Rádio Gaúcha, inspira uma reflexão necessária. A divulgação de conversa telefônica entre o agora ex-blogueiro da revista Veja e uma fonte, a irmã do senador Aécio Neves (PSDB-MG), Andrea Neves, atropela frontalmente a Constituição. Por isso, só pode merecer o rechaço da sociedade. Além de violar o princípio que garante a intimidade dos cidadãos, a decisão fere o direito ao sigilo da fonte, um pressuposto da liberdade de expressão. É inadmissível que esse tipo de ato ocorra num momento decisivo do combate à corrupção, a partir de um diálogo sem ligação com as investigações.
Sigilo da fonte é uma garantia constitucional para o exercício do jornalismo profissional. Independentemente de, no caso, ter ocorrido erro processual ou quebra deliberada desse princípio democrático, houve um escorregão que acaba manchando as apurações. Diante da gravidade do fato, é preciso que as circunstâncias e as motivações sejam esclarecidas. O Supremo Tribunal Federal (STF) e o ministro Edson Fachin devem agir com transparência. Se houve erro, é preciso repará-lo ou pedir desculpas. Se esse tipo de situação persistir, como alerta o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Claudio Lamachia, "estaremos mutilando de forma irremediável o direito da sociedade de ser informada".
O país não pode dar margem à criação de um Estado policialesco, em que o teor de um contato jornalístico seja divulgado como forma de intimidação ou de retaliação, simplesmente por conter críticas a quem quer que seja. Apontar falhas da Procuradoria-Geral da República (PGR) e de seu chefe, como fez o então blogueiro da revista Veja em caráter particular, não é crime. O juiz Sergio Moro já havia incorrido em erro semelhante ao autorizar a divulgação de conversas privadas da família do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O Brasil não pode se transformar numa Turquia, num Irã, numa Venezuela, onde as pessoas vivem com medo de conversar e emitir opiniões.
A credibilidade das investigações e dos responsáveis por elas depende apenas da determinação de fazer justiça, sempre em respeito ao arcabouço legal.