Em depoimento ao juiz Sergio Moro, o empresário Emílio Odebrecht afirmou que o chamado caixa 2, também identificado por recurso não contabilizado, sempre foi o "modelo reinante" no país, nas relações entre empresas privadas e governos, mais especificamente de financiadores de campanhas eleitorais com os candidatos e eleitos. Ainda que não esteja tipificado no Código Penal e que seja considerado até mesmo por autoridades apenas um delito eleitoral, é inquestionável que o uso do caixa 2 configura-se como um ilícito, muitas vezes agravado pela subordinação dos beneficiados aos doadores e pelo uso da máquina pública para favorecimentos. Como bem disse o ex-presidente do STF Ayres Britto nesta semana, é preciso fazer uma ginástica mental para distinguir caixa 2 de corrupção.
No momento em que a Operação Lava-Jato se aprofunda e revela a extensão da roubalheira institucionalizada, essa modalidade disfarçada de crime fica ainda mais caracterizada, pois fica-se sabendo que empresas prestadoras de serviços ao poder público superfaturavam contratos para retirar daí o dinheiro das doações. Em vários casos relatados nas delações, os corruptores cobravam contrapartidas dos governantes e parlamentares eleitos com o dinheiro subtraído da nação e desviado de atividades essenciais para a população. Se esse era – ou ainda é – o modelo reinante de financiamento de campanhas políticas, o país precisa acabar com ele logo, punindo exemplarmente os responsáveis por esta deformação da democracia.
Neste contexto, qualquer tentativa de anistia ao caixa 2 tem que ser repudiada com firmeza pelos cidadãos, até mesmo para que o Judiciário não se deixe enganar pelo discurso hábil de políticos que fazem contorcionismos verbais e legislativos para se salvar e para isentar seus pares. Trata-se de uma falácia, por exemplo, a teoria de que caixa 2 para campanha política é aceitável, sendo reprovável apenas quando se trata de uso do dinheiro para enriquecimento pessoal. Ora, não há pretexto que justifique a desonestidade, especialmente quando praticada por pessoas com representação popular.