Se viver é importante, como será quando acaba? Se a única certeza que temos é a de que um dia acabaremos, por que temos temor da morte?
Este assunto faz parte do meu dia e o que mais me chama a atenção é a variedade de sentimentos ao enfrentar a finitude. Vejo fins tumultuados, lentos, inesperados, sofridos... E vejo até fins tranquilos. Sim, a morte pode não ser o pior a acontecer para alguém. O sofrimento, sim. A morte é obrigatória. O sofrimento, não.
O que importa para que cheguemos mais inteiros à reta final é termos uma consciência do que somos. Parece simples. Mas não é. Sabermos o que somos pode parecer bem difícil. E é...
A certeza do que somos é, portanto, quase impossível. Ouviremos que somos 90% água e 10% outras matérias... Que somos pequenos seres rastejantes como formigas na face do planeta terra, que somos animais evoluídos com o polegar opositor, que somos almas repletas de amor, como descrito por Shakespeare, cheias de afeto e delicadeza, como por Cecília Meirelles, ou cheios de força e virilidade, como por Castro Alves.
No entanto, a forma como nos postamos frente às incertezas da vida será determinante para a paz no percurso final.
Hoje, um senhor muito doente, no leito, mas lúcido, falava comigo sempre de olhos fechados. Conversa monossilábica. Lá pelas tantas, perguntei:
– Por que o senhor não abre os olhos?
Ao que ele retrucou:
– Não precisa...
Um homem que precisava muito de atenção julga desnecessário abrir os olhos para tratar de sua própria vida... Minha próxima pergunta foi:
– O que mais o está incomodando agora?
A resposta veio, desta vez não sem antes abrir os olhos:
– Minha mulher!
Aqui, uma pendência não resolvida. Certamente um catalisador de dor. Uma dor para a qual não tem analgésico.
Inevitável, nestes momentos, fazer um exercício de como vislumbrar meus últimos dias por aqui.
Não quero estar sozinho. Quero meu filho comigo e, se possível, minha mulher. Não quero entrelinhas. Quero franquezas. Quero todos na mesma página. Juntos. Conscientes do momento. E, se houver dor, que não seja da alma. Para o resto, um doutor que me entenda.