Com a sequência de delações feitas pelos executivos de empreiteiras nos inquéritos vinculados à Operação Lava-Jato, o Brasil passou a ter certeza – e não apenas a suspeitar – de que por muitos anos o processo eleitoral foi contaminado pela prática de doações irregulares para candidatos dos principais partidos políticos.
Com estupefação e revolta, cidadãos e eleitores descobriram que boa parte dos problemas enfrentados com saúde, educação, segurança pública e infraestrutura têm sua origem na doação irregular de recursos relacionados a sonegação fiscal (Lei 8.137/90), lavagem de dinheiro (Lei 9.613/98), evasão de divisas (Lei 7.492/86) e até corrupção (art. 317 do Código Penal), quando o candidato recebe numerário sob a promessa de encaminhar algum benefício ou favorecimento ao doador, assim que eleito para o cargo em disputa. Nesse caso, conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal, candidato e doador podem ser processados criminalmente, sem necessidade de que a entrega de valores tenha se dado através de caixa 2. Vale dizer, a doação contabilizada e aparentemente lícita, na realidade, serve para "esquentar" o dinheiro da corrupção!
Para o crime comum de caixa 2, ou seja, sem a promessa de contrapartidas em prol do doador, o art. 350 do Código Eleitoral prevê pena de até cinco anos de reclusão e multa, se a doação declarada aos órgãos de controle é inferior àquela verdadeiramente recebida pelo candidato ou pela legenda partidária.
Como se trata de um crime disseminado por décadas, envolvendo um número de potenciais infratores talvez superior ao que a estrutura dos órgãos de persecução criminal seja capaz de investigar e denunciar, tão ou mais importante do que punir os culpados é reconhecer que essa prática só durou tantos anos por ineficiência dos meios de controle das campanhas eletivas. É chegada, portanto, a hora de o Brasil virar a página da hipocrisia que contagiou a relação entre candidaturas, partidos políticos, Ministério Público, tribunais eleitorais e tribunais de contas, inaugurando um novo tempo em que prevaleçam a transparência e a austeridade no que tange ao financiamento das campanhas e sua respectiva fiscalização.