São poucas as categorias de reais pagantes da tarifa cheia dos ônibus urbanos: donas de casa, trabalhadores informais, desempregados (os trabalhadores formais têm o vale-transporte suportado pelos clientes das empresas empregadoras). Assim, nas costas daqueles usuários é jogado o custo das isenções concedidas pelos governos e que representa em Porto Alegre cerca de 35% do valor final, ou seja, lhes é aplicado um incrível tarifaço de 53% (35/65).
Embora no todo não haja fundamento legal ou social, algumas dessas situações beiram à insanidade. Passagem de cidadãos com mais de 65 anos, em boa situação econômica, paga por desempregados. Meia passagem de estudantes filhos de pais ricos, da mesma forma. Passageiros pobres ajudando a custear os Correios e ricos usuários do transporte individual não. Se tais aberrações constassem, explicitamente, de um projeto de lei, o autor seria "linchado" publicamente, no entanto, disfarçadas em complexos e minuciosos cálculos tarifários, são aceitas como algo lógico, natural e inexorável.
Se os fatos em si são terríveis, os efeitos são mais graves ainda. A queda do número de passageiros pagantes é alarmante há muitos anos. Cada vez mais os pobres buscam se livrar do castigo imposto pelo Estado e, em muitos casos, a compra de um carro velho é a solução. Nesse ponto, um crime contra o meio ambiente pelo real incentivo à utilização do automóvel, pelos ricos porque o transporte público é ruim, pelos pobres porque a tarifa é muito elevada. Como agravante, os desmanches ganham milhares de clientes excluídos do mercado formal por evidentes razões. O resultado não precisa ser detalhado, é matéria policial largamente noticiada.
Ao final, uma simplificação grosseira, as empresas prestadoras do serviço de transporte são as causadoras de todo o mal e, assim, governos, conselhos e vários órgãos de defesa da cidadania e do consumidor, em relação aos custos operacionais do transporte, travam lutas heroicas para defender o pobre usuário.