Num país conflagrado pela intolerância e por ataques irracionais motivados na maioria das vezes por miudezas na vida real e na virtual, só pode ser vista como edificante a postura de líderes que, comovidos pela dor enfrentada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva diante da agonia de dona Marisa Letícia, souberam colocar-se acima de divergências pontuais. É o caso do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que retribuiu a visita recebida durante o funeral de dona Ruth Cardoso, e do presidente Michel Temer, que na quinta-feira foi até o Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, manifestar suas condolências. Senso de humanidade tem que preceder sempre quaisquer diferenças, incluindo as de ordem política ou ideológica.
Desavenças têm limites, e foi exatamente isso o que demonstraram ex-chefes de Estado, posicionados em campos antagônicos, e o atual. Essa é uma lição que de certa forma atenua a beligerância pregada pelos chamados haters das redes sociais, que só aceitam quem pensa e age igual, e pelos radicais de todas as ideologias, que vaiam e hostilizam políticos em aviões, aeroportos, em posses, como na Assembleia Legislativa, ou na porta do hospital, como ocorreu quinta-feira à noite.
Quando não são detidas por um chamamento à razão, práticas contumazes de intransigência vão num crescendo a ponto de darem margem até mesmo a episódios de violação da ética, como o que resultou na quebra de sigilo médico da ex-primeira-dama. Divergências são salutares quando fomentam o debate, não a crueldade, principalmente por parte de quem presta juramento de respeito ao próximo, sem discriminação.
Por mais profundas que sejam, discordâncias não podem atropelar respeito, educação e convivência social, aspectos desconsiderados durante a agonia da ex-primeira-dama. A turma do ódio acima de tudo prestou um desserviço ao país em suas manifestações públicas nesse caso específico, que só não foi mais deplorável pela maturidade e sensatez demonstrada no gesto de líderes políticos mais experientes.