Manhattan ficou em silêncio quando ficou claro que Donald Trump havia vencido a eleição. Ninguém sabia como reagir. Ninguém estava preparado. Várias colegas minhas estavam no evento oficial que deveria comemorar a vitória de Hillary Clinton. A derrota só ficou real quando escutei a primeira menina chorando nos corredores do dormitório da faculdade. Depois delas vieram várias – à 1h da manhã, quero lembrá-los, ninguém cogitava ir dormir. Um pouco dramático, mas o cenário era igual ao que eu imagino que seja o do momento em que anunciam uma guerra: as pessoas sentadas no chão chorando e tentando entender o que estava acontecendo.
Alguns minutos depois, surgiu o evento no Facebook que convidava todos a irem para o centro do campus de Columbia gritar. Não era um chamamento para protesto, ainda não, era simplesmente para gritar. Quando cheguei lá, foi isso mesmo que aconteceu. Alunos de uma das melhores universidades do mundo – basicamente, uns nerds – gritando para o nada.
O dia seguinte não foi melhor. Com a movimentação dos estudantes, conseguimos que a maioria das provas fosse cancelada. Mas ainda tínhamos que levantar e seguir com as tarefas do dia. Como meu professor de política lembrou, "não importa o que aconteça, o sol vai nascer amanhã" (ironicamente quarta-feira foi o primeiro dia de chuva em algumas semanas aqui em Nova York). Mas no elevador ninguém dizia oi. Na portaria, não deram bom dia. Nem no refeitório. Em vez dos sorrisos que eu normalmente recebo nos corredores, as pessoas olhavam para mim como se quisessem dizer que tudo vai ficar bem. Elas não foram muito convincentes.
Minha primeira aula, por sorte, era a de Política Americana. Meu professor, Michael G. Miller, especialista em eleições com PhD na Cornell University e dois livros publicados sobre o assunto, entrou, sentou no palco (o que ele nunca faz) e disse que ele não daria a aula de Suprema Corte que estava planejada para aquele dia. Não tinha clima. Passamos a próxima hora e meia fazendo perguntas – e ele, meio triste, tentando responder. Aqui vai uma breve lista dos momentos mais interessantes dessa conversa.
1) Os cientistas políticos já tinham previsto a vitória do candidato republicano, não importando quem fosse, em julho. A "teoria dos fundamentos" utiliza números como a percepção da população da economia, a taxa aprovação do presidente atual e o número de anos que ele ficou no poder para prever com bastante exatidão (não teve nenhum erro desde os anos 1980) quem vai ganhar. Para esses cientistas, as campanhas literalmente não importam. Importa qual o "tabuleiro" que o candidato recebe.
2) Os Estados Unidos devem entrar em recessão econômica e carregar a Europa junto. O governo federal americano, ao contrário de 2008, não vai ter dinheiro para administrar a crise.
3) A Rússia, dentro das próximas três semanas, vai fazer uma movimentação militar. Provavelmente no Leste Europeu, porque os EUA devem sair da OTAN (uma das poucas coisas que Trump afirmou).
4) Os danos ao meio ambiente que essa presidência irá causar serão irreparáveis. Trump pretende tirar o dinheiro investido em controle do aquecimento global.
5) Pela primeira vez desde 1928, o Partido Republicano vai controlar os três poderes: o Executivo com Trump, o Legislativo com a maioria nas duas câmaras e o Judiciário, com o novo juiz da Suprema Corte que Trump indicará no seu primeiro dia de mandato.
6) Alguns casos importantes da Suprema Corte correm perigo de serem anulados. Roe vs Wade, que garante o direito ao aborto, será o mais atacado.
7) O Affordable Care Act, ou Obamacare (a lei que garante plano de saúde acessível para os mais pobres), vai acabar.
8) Uma das razões por que as pesquisas erraram feio o resultado pode estar na análise do voto de mulheres brancas. Muitas mentiram nas pesquisas por vergonha de dizer que votariam no Trump, mas votaram.
Estudar política nos Estados Unidos em 2016 é, no mínimo, histórico. Não sei o que a presidência do Trump vai fazer em termos de leis (acredito que nem ele saiba), mas o movimento político que essa eleição vai gerar será enorme. Quarta-feira foi um dia estranho. Esta semana provavelmente vai ser assim, meio em clima de funeral. Mas, na segunda-feira, a vida recomeça. E aqui em Columbia a luta vai ser constante. Porque Donald Trump não representa a juventude e ninguém aqui vai aceitar essa visão de mundo que ele vende. Principalmente em Nova York.