Estudei a vida inteira em escola pública. Primeiro na Luciana de Abreu, estadual, depois no Colégio de Aplicação, da UFRGS, e por fim na Fabico. A maior lição de todo esse tempo não aprendi com um professor, mas no convívio com os colegas. Essa lição vem bem a calhar atualmente: o mundo não é em preto em branco; há muitas gradações de cinza; e a cor de uma bandeira não define uma pessoa.
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Meus colegas vinham de várias classes sociais (havia os mais ricos, os mais pobres), representavam diferentes etnias e tinham famílias com os mais distintos matizes ideológicos. Acho que aprendi desde cedo a viver fora de uma bolha, a perceber o "outro", a ter um mínimo de empatia. Isso não chegou a fazer de mim um sujeito agregador ou mesmo gregário – pelo contrário, me vejo como um solitário (não tenho a famosa turma de amigos, visito pouco os que tenho, não saio para beber, não jogo mais bola, curto o silêncio) –, mas, por outro lado, permitiu que eu transitasse tranquilamente por grupos tão desiguais entre si (quando não antagonistas).
Lembro disso nestes tempos extremados, em que amigos rompem laços por posições políticas; em que tudo é ideologizado (das medalhas olímpicas à separação do casal Fátima Bernardes e William Bonner); em que ou você é do Partido A ou você é do Partido Z; em que enxergar virtudes do "outro lado" é traição; em que o mesmo fato é usado e por vezes distorcido para provar pontos de vista contrários; em que as convicções erguem muros e derrubam as janelas de diálogo; em que as redes sociais são patrulhadas ("hoje é dia de limpar minha timeline"). São tempos, também, em que é obrigatório ter opinião sobre tudo. Chego a me sentir um idiota, incapaz de acompanhar todas as notícias e todas as revelações e todas as acusações e todas as interpretações, incapaz de afirmar, peremptoriamente, isso é isso e aquilo é aquilo, incapaz de assumir que tenho mais dúvidas do que certezas.
Tem sido um exercício diário de tolerância abrir o Facebook e ler tantos posts de rotulagem ou desqualificação, de desrespeito ou de ódio – aliás, muitos deles assinados por colegas meus de Luciana, de Aplicação, de Fabico, de profissão. Quem está em uma trincheira já não pensa mais em convencer o "adversário". Parece que o que importa é conversar apenas com os que compartilham da mesma causa – os outros que se ralem.
Não existe meio-termo, não existe equilíbrio, não existe o cinza e sua riqueza de variações, a civilidade de suas variações. Me sinto isolado como nunca me senti em uma sala de aula.