Vi muitas pessoas chocadas e surpresas com o caso da menina que foi hostilizada durante uma audiência pelo promotor Theodoro Alexandre da Silva Silveira depois de ter sido repetidamente estuprada por seu pai.
A culpabilização da vítima acontece todos os dias, como no caso em que um juiz do interior de São Paulo absolveu um delegado acusado de estuprar a própria neta, de 16 anos, por achar que a relação foi consensual. Sei como é o tratamento em boa parte das Delegacias da Mulher, que deveriam acolher as vítimas, mas frequentemente as fazem passar por uma segunda violência, duvidando de seus depoimentos e desencorajando denúncias. Não é um caso isolado e não será o último. Lembrando que cerca de 70% dos estupros são perpetrados por conhecidos ou familiares, então não, não fiquei surpresa. Fiquei, sim, muito enojada.
"Pra abrir as pernas e dá o rabo pra um cara tu tem maturidade, tu é autossuficiente, e pra assumir uma criança tu não tem (...) se tu fosse maior de 18 eu ia pedir a tua preventiva agora, pra tu ir lá na Fase, pra te estuprarem lá (...)"
Ele estava falando com uma adolescente em situação de vulnerabilidade, sozinha em uma audiência. Exames de DNA no feto provaram que ela disse a verdade. E, de qualquer forma, a menina teria direito ao aborto legal e seguro; ela era menor de 14 quando ocorreram os estupros.
"Tu teve coragem de fazer o pior, matou uma criança, agora fica com essa carinha de anjo. Além de matar uma criança, tu é mentirosa? Que papelão, heim? Vou me esforçar pra te ferrar, pode ter certeza disso, eu não sou teu amigo"
Vejam, o pior é fazer um aborto, segundo ele, "matar uma criança" (dica: feto não é criança), e não um pai violentar repetidamente sua filha e ela correr o risco de dar à luz um filho/irmão.
Esperamos que esse caso tenebroso não seja esquecido e traga à luz a falta de preparo para lidar com vítimas de violência sexual, seja por parte da polícia, dos promotores, dos juízes envolvidos no caso e, principalmente, da sociedade, que não hesita em apontar dedos para vítimas, duvidando de suas histórias.