Como era previsível, a sessão do Senado destinada ao chamado juízo de pronúncia da presidente Dilma Rousseff, última etapa antes do julgamento definitivo do impeachment, não alterou em nada a visão dos seus julgadores: os defensores mantiveram o discurso de que se trata de um golpe porque não houve crime de responsabilidade e os acusadores sustentaram que o crime não só está configurado como também reconhecido pelas instituições que respaldam a democracia e a Constituição. A maioria, como também já se esperava, defende esta segunda interpretação, que as pesquisas de opinião têm revelado ser também a de parcela majoritária da população brasileira.
"Foi um crime pequeno, mas um crime" – admitiu o senador Cristovam Buarque (PPS-DF), ex-ministro de Lula e até pouco tempo atrás considerado um voto possível de ser recuperado pelos petistas. Mas ele reafirmou sua disposição de votar com a maioria, pelo impeachment, uma justificativa que não deixa dúvida: "Se estivéssemos no parlamentarismo, não teria a menor dúvida de que deveríamos dar um voto de desconfiança".
O Senado, por maioria simples, já deu o seu voto de desconfiança, pelo que os próprios parlamentares chamam de conjunto da obra da presidente afastada: o desastre político que foi o seu governo, o agravamento da crise econômica e o escândalo de corrupção investigado pela Operação Lava-Jato. Pouca gente sabe exatamente o que significa pedalada fiscal (o atraso de pagamento da União a bancos públicos para execução de despesas), mas não há quem não saiba que a Petrobras foi espoliada, que os políticos de vários partidos se beneficiaram das propinas cobradas por empresários desonestos e que o governo tentou acobertar seus apadrinhados. Tudo isso foi para a conta de Dilma Rousseff.
O discurso do golpe fragilizou ainda mais o governo. O impeachment é um instrumento democrático, garantido pela Constituição e conta com o respaldo e a condução do Supremo Tribunal Federal. Trata-se, portanto, de um processo legítimo, ainda que a presidente alegue inocência e que seus defensores levantem suspeitas sobre a legalidade do julgamento político. O questionamento reforça a tese da legitimidade, pois a presidente afastada vem recebendo amplas oportunidades para se defender, como comprovam suas manifestações públicas e a aguerrida atuação dos integrantes do que se convencionou chamar de tropa de choque de Dilma – o ex-advogado-geral da União José Eduardo Cardozo e os senadores Vanessa Grazziotin (PC do B-AM), Gleisi Hoffmann (PT-PR), Humberto Costa (PT-PE) e Lindbergh Farias (PT-RJ).
Ao optar pelo encaminhamento do impeachment, o Senado segue a vontade da maioria da população, manifestada inequivocamente nos protestos de rua do ano passado e nas pesquisas de opinião. Os brasileiros não apenas desconfiam dos governantes afastados, mas também daqueles que os substituem interinamente e da classe política como um todo. Por isso, tão logo seja superado esse doloroso processo de julgamento de uma presidente eleita e reeleita de forma livre e democrática, é essencial que a confiança dos brasileiros nas instituições e nos próprios representantes políticos seja restabelecida.