Somos hipócritas. Diante do fracasso de atletas famosos, de ídolos europeus do futebol, fingimos uma brasilidade patriota que não nos pertence mais. "Malandramente", nos apossamos de conquistas alheias para nos regozijarmos apenas com os méritos.
Explico. No caso mais "pop", foi só o Neymar e sua seleção de estrelas não corresponderem às expectativas e #SomosTodosMarta. "Jogar como mulher" passou a ser mérito. O que fazíamos enquanto ela treinava e competia? Tentamos tomar de assalto o que não nos pertence, como a prata do atirador Felipe Wu e o ouro da judoca Rafaela Silva.
Sobre essa última, ainda cabem outras indagações, não quanto à sua capacidade inquestionável de resiliência, mas a nós mesmos. Onde estávamos quando, em 2012, a atleta foi hostilizada ao ponto de, hoje, responder que "o macaco que tinha que estar na jaula hoje é campeão"?
Não há orgulho na derrota, e a solidariedade só cabe aos jubilosos. Não fosse desse modo, por que não temos empatia com as agruras ou os fracassos? Isso deixemos para os derrotados, aos vaiados e àqueles que ainda pensam que o importante é competir. Não é. Importante é estar ao lado de quem vence. Às vezes, mais do que vencer.
São esses os fatos explícitos demonstrados com a vitória da ex-anônima Rafaela Silva. As redes sociais espelham nossa alma de teclado, onde alguns mais à esquerda orgulham-se de ela ser mulher, negra, com história de vida oriunda na pobreza. Outros, mais à direita, igualmente se apropriam do fato de ela ser militar da Marinha.
Para seu treinador, como se isso fosse condição da vitória, foi necessário "direcionar sua raiva" ao esporte, como se para vencer nessas condições de brasileiro é preciso ter raiva. Estamos todos errados, Rafaela ganhou porque tem talento, porque treinou e não porque ganhou bolsa ou é de esquerda ou de direita ou mulher ou negra.
A medalha é dela. A vitória é dela e de todos aqueles que se superam e conquistam. Enquanto sociedade, fomos derrotados e nos resta apenas a micagem.