Depois de sucessivas manobras para retardar a cassação de seu mandato pela Câmara, por quebra de decoro e por ter mentido a seus pares sobre a propriedade de contas suspeitas no Exterior, o deputado Eduardo Cunha (PMDB/RJ) tirou a última carta da manga na tentativa de virar o jogo pouco limpo da disputa pelo poder: protocolou ontem um pedido de renúncia à Presidência da Casa. Apesar de se dizer perseguido e de jurar inocência com a voz embargada, ficou evidente o seu propósito de entregar os anéis (o cargo) para salvar os dedos (o mandato de parlamentar e, em consequência, o foro privilegiado para responder aos demais processos de que é alvo).
Cunha tenta repetir seu companheiro de partido e atual presidente do Senado, Renan Calheiros, que em 2007 utilizou a mesma estratégia; renunciou à presidência do parlamento na véspera do julgamento do seu processo de cassação pelo plenário da Casa. Como a votação era secreta, acabou sendo absolvido e, posteriormente, conseguiu retomar o cargo. Agora, porém, a decisão sobre Eduardo Cunha se dará por voto aberto e dificilmente os parlamentares resistirão à pressão da opinião pública pela cassação.
Apesar das segundas intenções do renunciante e do apoio que ele ainda recebe de colegas e correligionários, a renúncia não deixa de ser uma oportunidade para a Câmara recuperar minimamente a confiança da sociedade, promovendo uma eleição transparente para o comando da Casa e um julgamento sem concessões para o peemedebista, que ainda não conseguiu explicar satisfatoriamente as graves acusações que pesam sobre ele.
Não deixa de ser irônico que, em sua carta de renúncia, o deputado Eduardo Cunha se diga vítima de "perseguição e vingança" por ter dado início ao processo de impeachment contra a presidente Dilma – que também acusa o parlamentar de ter agido com a mesma motivação. E o mais impressionante é que ambos dizem que a História lhes fará justiça pela coragem.
O desencanto dos brasileiros com seus representantes políticos está diretamente relacionado ao envolvimento de autoridades com a corrupção, mas também decorre desse apego egoísta ao poder. É justamente por isso que o país precisa cada vez mais de instituições democráticas sólidas e independentes, que protejam os cidadãos da ambição desmedida, do messianismo autoritário e da inaptidão administrativa.