Numa entrevista, antes de se aposentar da literatura, Philip Roth disse não haver qualquer mistério em sua atividade: dessem-lhe tempo e condições de trabalho e haveria um novo romance. Como escritor, entendo bem o que ele quis dizer sobre a parte braçal, mas sigo sem alcançar – não creio que alcançarei – como alguém consegue escrever A marca humana ou O teatro de Sabbath.
Mas fiquemos com o tempo e o trabalho, com o medianamente possível, e assim anuncio dois novos livros, um de poesia, para novembro, pela editora Ardotempo, e, antes disso, pela Arquipélago, minha estreia na crônica com os textos publicados aqui em ZH.
A essa altura, no entanto, é imperioso admitir que a conversa inicial de sucessos não passou de um subterfúgio para retardar a confissão de meu mais rotundo fracasso. Nem tempo, nem vontade, mas incompetência me impediram de escrever um livro de autoajuda.
Às favas com a admiração dos pares, ao mar com as sutilezas da lírica. Uma obra que alcançasse o coração das massas, que trouxesse a este tão querido amigo de vocês lautos jantares às expensas dos direitos autorais.
O céu de cada dia. O título que restou, feito a placa de um condomínio num terreno para sempre baldio. Haveria, claro, o subtítulo explicativo: 365 sabedorias para viver melhor. Podem ver a capa flamejante? O adesivo de mais vendido do New York Times? Chorariam então Augusto Cury, os médicos da dieta Dukan, todos os mestres que prometem inteligência emocional no Himalaia, vendas ciclônicas em Marte, o usufruto de amigos pitbull. À abertura, eu revelaria os segredos do Gráfico do dia, uma poderosa ferramenta de controle pessoal, capaz de aplacar a tristeza, a melancolia, o pé de atleta e o cheque especial. E mais não revelo para não ser pilhado pela concorrência.
Um gráfico e as três primeiras sabedorias. Nada além.
Por vezes, sonho com o lançamento, as faixas, a raiva e a inveja de outros artistas como eu, que jamais serão gurus.
Nessas ocasiões, busco um culpado para além de mim (sempre a melhor estratégia, não creiam nos analistas) e o encontro: um camarada que me alertou para o risco do livro não funcionar em anos bissextos.
Graças a gente como ele, morre o empreendedorismo no Brasil.