Onde foi parar o brasileiro cordial? Foi o que questionei nesta semana, durante mais uma cobertura, a da greve dos caminhoneiros. A cordialidade foi atribuída ao nosso povo por Sérgio Buarque de Holanda (bastante respeitado, muito antes de ser conhecido como o pai do Chico Buarque...) no seu clássico Raízes do Brasil. O antropólogo se referia a emotividade, informalidade. Já eu me refiro ao ato de ser cortês, mesmo. Seja qual o sentido, deve estar em falta no mercado. Ao questionar um grevista sobre a curiosa pauta da greve - que ia do frete à derrubada da presidente Dilma -, fui enxovalhado nas redes sociais, à direita e à esquerda. "Esse jornalista conseguiu a façanha de achar um único caminhoneiro iludido, em meio a 5 mil contrários ao governo mais corrupto da história global", falou um leitor antipetista, puxando um coro de centenas de mensagens contra a matéria e o autor (eu).
Em seguida, a opinião do cidadão acima foi contestada por outro leitor, de esquerda: "Pelo Amor de Deus, vocês estão insanos! O Trezzi é um dos caras mais à direita de ZH, puxa-saco de milico, defensor da segurança!". Talvez ele se referisse à matéria recente que fiz, mostrando que a remoção do Comandante Militar do Sul por parte do governo Dilma gerou revolta nos quartéis do Exército...Talvez.
A nenhum deles ocorreu que, antes de ser petralha ou coxinha, posso ser apenas um jornalista. Um cara pago para questionar por que uma greve tem uma pauta tão plural quanto frete mínimo e renúncia da presidente... ou escalado para analisar o peso de um general no cenário nacional de crise política. Significa que sou contra a greve? Ou a favor de golpe militar? Parece não haver espaço para qualquer outra alternativa, nesses tempos de furor opiniático. Sequer para a razão óbvia, que jornalista é pago para mediar os questionamentos dos leitores (mídia = meio de comunicação). Não. Na lógica cartesiana dos embates cada vez mais ácidos da internet, devo ter escrito as reportagens com segundas, talvez terceiras intenções maquiavélicas... Só rindo. Mas sou um otimista. Creio que, apesar da internet se mostrar cada vez mais uma arena virtual, o brasileiro é mesmo cordial e retornará a suas raízes. Salve, Sérgio Buarque.