Se de qualquer candidato a ingressar na vida pública se espera uma folha corrida das mais transparentes, imagina para quem almeja ser presidente da República, primeiro-ministro ou secretário-geral da ONU. Tudo bem que no Brasil esse pré-requisito nunca foi levado a sério - do contrário, o país não teria elegido Fernando Collor de Mello em 1989 -, mas qualquer político que tiver a ambição de se tornar chefe de uma nação ficará muito mais visado do que um prefeito ou vereador de uma cidade interiorana. Se flertar com a corrupção, a chance de que saia no mínimo chamuscado é muito maior. Para que não pairem dúvidas sobre a conduta de um presidente da República, só resta seguir o velho provérbio: à mulher de Cesar não basta ser honesta, tem de parecer honesta.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode não ter se beneficiado de dinheiro público desviado da Petrobras. Também pode não ter feito tráfico internacional de influência para ajudar a construtora Odebrecht a ganhar contratos na América Latina e na África com dinheiro do BNDES. Assim como também pode não ser verdade o depoimento do lobista e delator Fernando Baiano ao Ministério Público dizendo que repassou R$ 2 milhões "para uma nora" do ex-presidente quitar uma dívida de um imóvel. E mais: pode ser verdadeiro o que Lula disse à época do mensalão de que não sabia que os seus principais homens de confiança pagavam parlamentares da base aliada para que votassem a favor das causas do governo.
Até ontem à noite, não havia provas que desmentissem Lula. E talvez nunca venham a aparecer. Embora fique difícil de entender por que um político experiente age muitas vezes no limite da ética e legalidade e se cerque de assessores suspeitos - alguns condenados. Talvez Lula entre para a galeria dos maiores injustiçados da história da política brasileira, com o risco de carregar a pecha de o mais ingênuo de todos os ex-presidentes da República.