Por Rodrigo Lopes, jornalista e membro do Conselho Editorial da RBS
A Guerra do Vietnã, o “imperialismo” americano, o embargo econômico a Cuba e as violações do regime, a crise na Venezuela, o conflito Rússia x Ucrânia. Não é de hoje que temas internacionais – uns mais do que outros – são “importados” para o contexto brasileiro e, em geral, instrumentalizados por atores políticos domésticos.
Com o confronto entre Israel e Hamas não é diferente. Desde o infame 7 de outubro, cada palavra e ação no Oriente Médio alimenta, do lado de cá, a 16 mil quilômetros de distância, discussões apaixonadas (e por vezes raivosas) turbinadas pelo ambiente de polarização nacional.
Recém-chegado do front, onde atuei como correspondente nos primeiros dias da guerra, desembarquei na última terça-feira na reunião mensal do Conselho Editorial do Grupo RBS. Entre os vários desafios que a atual confrontação impõe ao jornalismo, o fenômeno da “abrasileiração” do conflito é um dos que mais preocupam.
Ao “abrasileirarmos” o conflito desconsideramos nuances, ignoramos a História e descontextualizamos decisões
São vários os riscos de se olhar rivalidades no Exterior sob as lentes de nossa compreensão do mundo: o primeiro é o de se cair na simplificação da disputa, relegar uma crise ao duelo direita x esquerda, que não só reduz a complexidade da guerra a uma lógica de “mocinho x bandido”, como ignora que o Oriente Médio tem dinâmicas regionais próprias. Os movimentos no front ou nos gabinetes são influenciados por variáveis internas e externas e disputas de poder que não cabem em simplificações – tampouco se adaptam à realidade brasileira e a seus dilemas.
Ao “abrasileirarmos” o conflito desconsideramos nuances, ignoramos a História e descontextualizamos decisões. Este é o primeiro passo para que visões obtusas sobre a guerra se cristalizem.
O jornalismo profissional é antídoto para que se evite essa armadilha. Neste Conselho, firmamos posição em torno da necessidade de explicar, contextualizar, lançar luzes sobre fatos nebulosos, buscar diversidade de opiniões e propor soluções. Nossa linha editorial é a favor da paz, contra o terrorismo e em defesa da solução de dois Estados – um israelense e um palestino – legítimos. Buscaremos, em nossos espaços, evitar ao máximo a importação do conflito e o reducionismo desses dias insanos a disputas partidárias e ideológicas brasileiras.