No que deve ser o único debate entre eles nesta campanha presidencial dos Estados Unidos, Kamala Harris e Donald Trump partiram para o ataque. Ambos se acusaram de mentir e fizeram críticas diretas um ao outro no evento promovido pela emissora de televisão ABC News nesta terça-feira (10). O debate foi transmitido da Filadélfia, na Pensilvânia, um dos Estados-chave na eleição americana.
A vice-presidente democrata e o ex-presidente republicano nunca haviam se encontrado. Quando ambos entraram no estúdio, Kamala foi em direção a Trump, apertou a mão dele, e se apresentou, desejando um bom debate. O magnata retribuiu o desejo.
Mas já na primeira resposta da democrata, ficou claro que não haveria gentileza entre eles daí para a frente.
— Sou a única pessoa neste palco que tem um plano que é sobre elevar a classe média e a classe trabalhadora da América — afirmou a vice-presidente, ao ser questionada sobre a economia e o custo de vida nos Estados Unidos.
Trump respondeu destacando a atual inflação, mais alta do que quando era ele o presidente:
— Temos inflação como pouquíssimas pessoas viram antes. Provavelmente a pior na história da nossa nação. Temos 21%, mas isso é generoso, porque muitas coisas estão até 80% mais caras do que estavam há poucos anos.
O ex-presidente, já neste primeiro tema, passou a falar sobre a política de imigração. Ele critica duramente a entrada de estrangeiros nos Estados Unidos e, quando esteve no governo, chegou a iniciar a construção de um muro na fronteira com o México. Agora, ele diz que o governo de Joe Biden, no qual Kamala é vice, é permissivo com a imigração ilegal. Segundo ele, há mais de 21 milhões de migrantes entrando ilegalmente nos EUA.
— Muitas destas pessoas vindo são criminosos, e isto é ruim para nossa economia também. Imigração ruim é a pior coisa que pode acontecer para nossa economia. Eles, e ela (em relação a Kamala), destroem o nosso país com uma política que é insana — disparou, justificando após o apresentador do debate dizer que a imigração era um tema para outra pergunta.
Imigração
Quando tema da imigração foi proposto pelos mediadores, Kamala pareceu tentar diminuir a importância desta questão:
— Ele vai falar muito sobre imigração esta noite, mesmo quando não é o assunto em debate. E eu vou fazer algo muito inusitado e vou convidar você (eleitor) a participar de um dos comícios de Donald Trump, porque é uma coisa muito interessante de se assistir. Você vai ver que durante os comícios ele fala sobre personagens fictícios, como Hannibal Lecter, sobre moinhos causarem câncer, e o que você talvez não perceba é que as pessoas começam a deixar os comícios cedo, por exaustão e tédio. E vou te dizer: a única coisa sobre a qual você não vai ouvir ele falar é você, suas necessidades, seus sonhos e seus desejos. Eu acredito que você precise de um presidente que realmente coloque você em primeiro lugar.
O republicano afirmou que Kamala paga pessoas para irem aos comícios dela, e em seguida fez nova afirmação extrema sobre os supostos males que os imigrantes trazem ao país:
— Em Springfield, Ohio, as pessoas que vieram estão comendo os cachorros, estão comendo os gatos, os animais de estimação das pessoas que vivem lá.
O mediador afirmou em seguida que uma equipe da ABC contatou a administração da cidade citada, que afirmou que não há qualquer relato ou registro de ocorrência do tipo. O ex-presidente rebateu dizendo que viu uma pessoa na televisão falando a respeito.
Donald Trump voltou a trazer o tema da imigração quando foi perguntado sobre sua recusa em aceitar o resultado das eleições de 2020, em que foi derrotado por Joe Biden. Ele disse que há muitas provas de fraude naquele pleito, mas não citou qualquer uma.
— Nossas eleições são ruins. Muitos destes imigrantes ilegais entrando, eles estão tentando fazer eles votarem. Eles nem falam inglês, praticamente não sabem em que país estão, e estas pessoas (apontou para Kamala ao falar) estão tentando fazer com que eles votem. É por isso que estão deixando eles entrarem no país — acusou.
Aborto
Outro tema relevante na campanha e tratado neste debate é a legislação sobre aborto. Em junho de 2022, a Suprema Corte dos EUA reviu uma legislação de 1973, que estabelecia a interrupção da gravidez como um direito em todo o país. Com isso, as regras passaram a ser definidas por leis estaduais.
Trump afirma, e reiterou isto no debate desta terça, que era a vontade da maioria no país que a decisão ficasse para os Estados. Ele ainda afirmou que há democratas que defendem o aborto no nono mês de gestação e até a execução do bebê após o nascimento:
— Os democratas são radicais com isso.
Kamala rebateu:
— Ouvimos um monte de mentiras, e isso não me surpreende.
A vice-presidente disse que Trump nomeou três ministros à Suprema Corte com a intenção de derrubar o direito ao aborto e que, se ele voltar à Casa Branca, vai assinar uma proibição nacional à interrupção da gestação, prejudicando o atendimento até mesmo a mulheres que tenham engravidado após serem estupradas.
— O governo não deveria, e certamente Donald Trump não deveria, dizer a uma mulher o que ela deve fazer com o corpo dela — disparou Kamala.
O republicano negou que pretenda propor a proibição nacional.
Guerra no Oriente Médio
A mediação do debate também pediu que os candidatos falassem sobre a guerra em curso no Oriente Médio, de Israel contra o grupo terrorista Hamas.
A atual vice-presidente defendeu um cessar-fogo e a solução de dois Estados, que propõe a coexistência pacífica entre Estados independentes de Israel e da Palestina.
— Essa guerra deve acabar imediatamente e, para isso, é necessário um cessar-fogo e termos os reféns de volta. É preciso de um caminho para se ter uma solução de dois Estados. É preciso de segurança em Israel e medida igual para os palestinos — disse Kamala.
Trump disse acreditar que, se a democrata for eleita, Israel acabará:
— Ela (Kamala) está falando de Israel, mas ela odeia Israel. Se ela for presidente acredito que Israel deixará de existir em dois anos. Ela odeia Israel e a população árabe.
O debate teve duração de uma hora e meia, sem perguntas diretas entre os candidatos. Os temas eram definidos pelos apresentadores e os concorrentes tinham tempos predeterminados para respostas e comentários.
Este evento era aguardado com grande expectativa. O debate anterior nesta campanha teve enorme impacto, elevando a pressão que levou o atual presidente, Joe Biden, a desistir de tentar a reeleição, diante de dúvidas sobre sua condição de saúde. O democrata, de 81 anos, teve dificuldades para se expressar e sua participação foi considerada desastrosa.