Os Estados Unidos anunciaram, nesta quinta-feira (1º), novas sanções contra o exército e os paramilitares do Sudão, envolvidos em uma guerra pelo poder, embora estejam dispostos a retomar seu papel de mediadores.
Na quarta-feira, depois que o Exército suspendeu a participação nas negociações, 18 civis morreram e 106 ficaram feridos em um mercado da capital do país, Cartum, por disparos de artilharia e bombardeios aéreos das forças armadas, informou um comitê de advogados.
O Exército acusou os paramilitares das Forças de Apoio Rápido (FAR) de violação dos compromissos acordados e anunciou a saída do diálogo mediado por Estados Unidos e Arábia Saudita.
Os países mediadores acusaram os dois lados de violação da trégua, a qual deveria possibilitar a criação de corredores seguros para a entrega de ajuda a uma população que enfrenta cada vez mais dificuldades.
Em resposta, os Estados Unidos anunciaram nesta quinta-feira novas sanções econômicas e de concessão de vistos contra os líderes sudaneses por causarem "um terrível derramamento de sangue", disse o conselheiro de Segurança Nacional, Jake Sullivan, em um comunicado.
As sanções econômicas afetam, em particular, quatro empresas, segundo o Departamento do Tesouro: duas importantes empresas de armas do exército, e duas outras companhias, uma delas relacionada com as minas de ouro do Sudão, controladas pelo comandante das FAR, Mohamed Hamdan Daglo, e dois de seus irmãos.
"As sanções são uma ferramenta", explicou o especialista em Sudão Alex de Waal, que acredita que o caso do país africano, sob sanções dos Estados Unidos durante duas décadas, quando era governado pelo ditador Omar al Beshir, é "um exemplo clássico que mostra que as sanções nunca solucionaram os problemas".
E os dois generais em guerra conseguem se esquivar das sanções: o general Daglo é apresentado como um dos homens mais ricos do Sudão, terceiro maior produtor de ouro da África, e o general e líder do Exército, Abdel Fatah al Burhan, desenvolveu, sob o embargo previamente aplicado por Washington, técnicas para escapar das sanções internacionais.
Horas antes do anúncio das punições, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, afirmou, nesta quinta-feira, em Oslo, que os EUA continuam dispostos a atuar como mediador entre as partes no Sudão, mas que os dois lados "devem deixar claro, com suas ações, que levam a sério o cumprimento do cessar-fogo".
- Crianças em estado de desnutrição grave -
Mais de 1.800 pessoas morreram desde o início dos combates, de acordo com a ONG ACLED, e mais de um milhão de pessoas fugiram de suas residências.
Yaqout Abderrahim escapou de Cartum para Porto Sudão (nordeste), onde está esperando há 15 dias por uma vaga em um voo para deixar o país.
"Queremos ir a qualquer preço, porque nossas casas foram destruídas e já não temos como criar nossos filhos", declarou Abderrahim à AFP em meio a outras famílias que acampam no local.
Quase 25 milhões de pessoas, mais da metade da população do Sudão, precisam de ajuda e proteção, afirma a ONU.
Bairros inteiros de Cartum estão sem água corrente, a energia elétrica está disponível por poucas horas a cada semana, e 75% dos hospitais em áreas de combate estão desativados.
De acordo com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), mais de 13,6 milhões de crianças precisam de ajuda humanitária, incluindo "620.000 que estão em condição de desnutrição aguda, metade delas sob risco de morte, caso não recebam atendimento a tempo".
Quase 350.000 pessoas fugiram para os países vizinhos: metade para o Egito; e o restante, para Chade, Sudão do Sul, República Centro-Africana e Etiópia.
O Sudão está à beira da fome, segundo a ONU, e a temporada de chuvas se aproxima, com o risco de epidemias.
Os combates mais violentos são registrados em Darfur, na fronteira com o Chade, onde algumas regiões estão completamente isoladas do resto do mundo, sem eletricidade nem telefone.
* AFP