Radicado há 15 anos no Brasil, o padre italiano Dario Bossi defendeu , nesta segunda-feira (21), a revisão pela Igreja Católica do tradicional uso do ouro em seus objetos sagrados.
— Seria um sinal muito forte se a igreja evitasse o ouro em suas liturgias e cerimônias — afirmou Bossi, 47, durante entrevista coletiva no Vaticano com participantes do Sínodo da Amazônia — O uso sóbrio dos símbolos religiosos é uma chamada para a nossa igreja — disse.
A declaração de Bossi foi em resposta a uma pergunta do padre jesuíta norte-americano Thomas Reese, colunista da publicação National Catholic Reporter. Ele afirmou que, apesar dos problemas associados à extração de diamante e ouro, ambos continuam sendo usados pela igreja no "sacramento do matrimônio" e em adornos sagrados.
Ao defender a revisão do emprego do ouro pela igreja e pela sociedade em geral, Bossi afirmou que apenas 10% do metal é usado em processos úteis.
— O resto fica armazenado ou é usado para joalheria — disse.
De acordo com o World Gold Council (Conselho Mundial do Ouro), 52% da demanda mundial vem da indústria joalheira. Em segundo lugar, aparece a produção de barras e moedas, com 27%. O emprego em tecnologia vem em seguida, com 9%. O cálculo foi feito sobre o destino da produção entre 2008 e 2017.
No Brasil, o missionário comboniano é membro da Rede Igrejas e Mineração e da Comissão Especial da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) para a Mineração. Em Roma, está como padre sinodal (com direito a voto) e representa "todas as vítimas do extrativismo predatório", como declarou em entrevista recente à Rádio Vaticano.
Durante a coletiva, Bossi, que morou por 11 anos em Açailândia (MA) e atualmente está radicado em São Paulo, criticou duramente a atuação da Vale na Amazônia e em Minas Gerais, além do garimpo ilegal de ouro.
— Ninguém mais suporta esse sistema na Amazônia — defendeu.
A Rede Igrejas e Mineração foi criada em 2015. De caráter ecumênico e com atuação em toda a América Latina, tem presença no Brasil, na Colômbia e no Equador, entre outros países. Atualmente, a iniciativa prepara uma campanha de desinvestimento da mineração.
— É uma rede que tenta acompanhar as comunidades de fé atingidas por atividades mineiras e, a partir da espiritualidade, tenta fortalecer a resistência, dar visibilidade às denúncias e sensibilizar as instituições religiosas com respeito à necessidade de defesa dessas comunidades — disse.
A Comissão Especial da CNBB para a Mineração e a Ecologia Integral, explica Bossi, foi criada no mês passado. Sua missão é auxiliar bispos e dioceses sobre o papel da igreja com relação aos impactos da atividade dentro do Brasil.
Entenda o sínodo
O que é sínodo
O Sínodo dos Bispos é uma reunião episcopal de especialistas. Convocado e presidido pelo Papa, discute temas gerais da Igreja Católica (como juventude, em 2018), extraordinários (considerados urgentes) e especiais (sobre uma região). Instituído em 1965, acontece neste ano pela 16ª vez.
Especial Amazônia
Anunciado em 2017 pelo papa Francisco, o Sínodo da Amazônia trata de assuntos comuns aos nove países do bioma, organizados em dois eixos: pastoral católica e ambiental. Depois de meses de escuta da população local, bispos e demais participantes se reúnem entre 6 e 27 de outubro, no Vaticano.
Para que serve
O sínodo é um mecanismo de consulta do Papa. Os convocados têm a função de debater e de fornecer material para que ele dê diretrizes ao clero, expressas em um documento chamado exortação apostólica. As últimas duas exortações pós-sinodais foram publicadas cerca de cinco meses depois de cada assembleia.
Quem participa
O Sínodo da Amazônia reúne 185 padres sinodais (como são chamados os bispos participantes), sendo 57 brasileiros. Além dos bispos da região, há convidados de outros países e de congregações religiosas. Também participam líderes de outras comunidades cristãs, da população e especialistas — no total, há 35 mulheres. O Papa costuma presidir todas as sessões.
Principais polêmicas
Este sínodo tem recebido críticas do governo brasileiro, incomodado com o viés ambiental e pressionado pela situação na Amazônia, e da ala conservadora da igreja, que vê como inapropriado o debate sobre a ordenação de homens casados como sacerdotes, a criação de ministérios oficiais para mulheres e a incorporação de costumes indígenas em rituais católicos.