As cozinheiras Adriana dos Santos Flores, 41 anos, e Eva Silva da Rocha, 71 anos, foram funcionárias por cinco anos da FA Recursos Humanos, em Porto Alegre, uma das 19 empresas terceirizadas interligadas por laços familiares ou de amizade. Elas trabalhavam preparando refeições para o público atendido no Centro de Referência de Assistência Social (Cras) no bairro Restinga, controlado pela Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc), órgão da prefeitura da Capital.
O contrato se encerrou no começo de maio de 2017. Segundo as cozinheiras, o pagamento de salários estava atrasado havia dois meses, período em que seguiram trabalhando. Na época, a FA culpou a prefeitura pelo atraso no repasse de valores, enquanto a Fasc alegou que a empresa não teria comprovado a execução dos serviços. Em um final de semana de maio, Eva foi surpreendida em casa por uma visita. Era um supervisor da FA. Ele havia convidado Adriana a ir até lá — as duas são vizinhas na Restinga — para anunciar o desligamento de ambas.
— O supervisor nos chamou para conversar, em um sábado, e nos demitiu. Trouxe a rescisão para assinar e disse para procurar nossos direitos — lembra Adriana.
Da quantia que deveriam receber, só conseguiram sacar os depósitos no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Por meio da Justiça do Trabalho, elas cobram valores referentes a salários atrasados, rescisão, multa de 40% sobre o FGTS e férias proporcionais. Ação foi aberta por advogados do sindicato da categoria em favor de Adriana, Eva e mais 39 ex-empregados da FA em 2017.
A 24ª Vara do Trabalho de Porto Alegre chegou a mandar bloquear valores que a FA teria a receber da Fasc para garantir pagamentos às 41 cozinheiras, mas isso não se confirmou. Conforme manifestação do órgão municipal no processo, a FA teria verba a receber, mas não apresentou documentos que comprovam a execução do serviço, o que inviabilizou o repasse.
Além disso, como a FA faliu em dezembro, as cozinheiras terão de tentar garantir algum crédito no processo de falência, que tramita em Cachoeirinha, último endereço da empresa.
— Ser demitida é muito ruim, mas não receber o que se tem direito é ainda pior — desabafa Adriana, que passou a produzir doces e salgados para sobreviver.
Eva atuou por 25 anos como cozinheira no Cras para diferentes terceirizadas. Aposentada, desistiu de seguir trabalhando:
— Me senti muito humilhada.
Os empregados enfrentavam outra dificuldade: encontrar a sede da empresa para reclamar os pagamentos.
— Uma hora o recibo de pagamento vinha com endereço de Cachoeirinha, outra de Porto Alegre. Um dia, por acaso, descobrimos que a sede era na Avenida Cairu (na zona norte da Capital). A gente trabalhava sem saber para quem — lamenta Eva.
Embora tenha trabalhado em outra empresa, Claudio Luis Dias da Silva, 54 anos, enfrentou situação semelhante à das cozinheiras. Morador de Esteio, atuou por 11 meses como auxiliar de serviços gerais para a Multiágil em unidade da CEEE, em Canoas. Claudio conta que foi demitido em março de 2018. Na época, segundo ele, o salário estava atrasado havia dois meses, não recebia o valor integral do vale-alimentação e a empresa não quitou valores referente à rescisão do contrato. Ao ir a uma agência da Caixa, outra má notícia: o saldo do FGTS estava zerado. A empresa não teria efetuado depósitos.
— Trabalho desde 1985 em firmas terceirizadas que sempre pagaram direitinho. Quero meus direitos — diz o ex-empregado.
Assim como no caso da FA, Claudio e outros 24 ex-empregados da Multiágil tentam cobrar a dívida na Justiça por meio do sindicato. A 2ª Vara do Trabalho da Capital determinou bloqueio de valores à CEEE, mas a companhia, que rescindiu o contrato por descumprimento de cláusulas, respondeu que a Multiágil não tinha créditos a receber. Sem emprego, vivendo de biscates, o ex-auxiliar terá de se habilitar em uma ação do Juízo Auxiliar de Execução e Precatórios, que pretende vender veículos da empresa para quitar débitos com 281 ex-colaboradores.