A aposentada Sirlei Juchem Flores, 59 anos, não hesitou em abrigar em sua casa os vizinhos. Moradora do bairro Vila Rica, em São Sebastião do Caí, ela mostrava, bastante impressionada, a força da correnteza na rua lateral de onde viveu toda a vida. Eram 9h15min desta quarta-feira (1º). No dia anterior, 30 de abril, foi o aniversário dela. A data acabou marcada por um acontecimento negativo: a água do Rio Caí entrou pela primeira vez na residência de Sirlei.
— Para a gente é algo inédito. Nunca vi nada assim. Só não perdi móveis porque chamei um caminhão para levar minhas coisas — conta.
Quase 300 pessoas estavam fora de casa no município na manhã desta quarta. A maioria foi levada para abrigos. Praticamente todos os bairros estão inundados. Barcos passam pelas ruas. O acesso à internet é impossível em muitos locais.
O nível do rio subiu mais de 1m20cm da noite de terça-feira (30) para a manhã desta quarta. A medição das 5h30min marcou 16m67cm. A cota de inundação é de 10m50cm. Porém, segundo a Defesa Civil, o nível estabilizou. Mas a chuva que ainda cai representa uma ameaça.
No bairro Lajeadinho, a água bateu no teto de algumas casas. Moradores caminham no meio do alagamento com o que conseguem salvar nas costas. Alguns choram e lamentam as perdas. E o pior: ainda chove, às vezes com intensidade.
Nessas horas, a solidariedade também mostra força. Sirlei está com o casal vizinho em casa. Os dois trouxeram os cães Pirata e Quiquim, um colchão e apenas alguns objetos. Foi o que deu tempo de salvar enquanto a cheia invadia ruas, pátios e tirava o sossego da família.
— Não vimos ainda o que perdemos — diz a dona de casa Suzana Silva, 68.
Era possível ver a casa dela completamente tomada pelas águas barrentas. Deitada no colchão, Suzana era reconfortada pelo marido José Hélio Santos Silva, 63, operador de máquinas na prefeitura de São Sebastião do Caí. Os dois cachorros recebiam afagos e olhavam a água passar.
Um dos barcos circulando pelas ruas do bairro Lajeadinho era movido pelas remadas determinadas de Heine Erni Trein, 63. Ele carregava na embarcação um aparelho de som, que utiliza no trabalho e agiu para salvar. Na casa onde vive com o pai, de 97 anos, a água causou muitos estragos. E na dos vizinhos também.
— Nunca vi uma tragédia tão grande assim. Sempre morei aqui e não tinha visto algo parecido. Vou para a casa do meu genro — desabafa o morador.
Por onde se caminha e para onde se olha se vê água. E muita. Desta vez, a chuva não foi acompanhada de vendaval na cidade, então quase não houve destelhamentos ou queda de árvores.
Segundo o comandante Anderson Jociel da Rosa, do Corpo de Bombeiros Voluntários de São Sebastião do Caí, o rio baixou dois centímetros na manhã desta quarta. Essa pequena medida representa uma esperança de que as coisas, pelo menos, não piorem.
— Os bairros mais afetados e que mais fizemos resgates foram Navegantes, Quilombo, Vila Rica (onde fica a sede dos bombeiros) e Rio Branco — enumera Rosa.
— A coisa é surreal. A enchente veio lenta e a população também auxilia muito — afirma o coordenador da Defesa Civil de São Sebastião do Caí, Enio dos Santos.
Pelo menos 21 bombeiros atuavam na cidade com o auxílio de sete embarcações. Militares do Exército de Cachoeira do Sul também ajudam. Uma equipe da Força de Resposta Rápida do Corpo de Bombeiros Militar de Santa Catarina é esperada para somar forças.