O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) abriu um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra o desembargador do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) Carlos Roberto Lofego Caníbal, que é réu por violência doméstica contra a ex-esposa (relembre, abaixo, o caso).
O advogado Aury Lopes Júnior, que defende o magistrado, disse que não teve acesso à integra da decisão do CNJ, mas afirma que ela lhe "causa muita surpresa".
— O processo criminal já está com a instrução encerrada, tendo sido demonstrado à exaustão que os fatos não existiram. Não houve violência psicológica e nem moral. Ademais, os fatos não têm qualquer relação com o exercício da jurisdição, sendo completamente descabida a abertura de um PAD. Mas insistimos: os fatos imputados não são verdadeiros, não ocorreu qualquer tipo de violência e tudo foi demonstrado na instrução — afirma o advogado.
De acordo com o CNJ, o desembargador foi acusado de ameaçar física e psicologicamente a ex-esposa entre agosto de 2018 e julho de 2019. O Ministério Público (MP) ofereceu denúncia contra o magistrado à Justiça pelos crimes de ameaça "com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher". A denúncia foi aceita pela Justiça em 20 de abril de 2022 e o magistrado responde ao processo desde então.
Relembre o caso
A ex-esposa do magistrado registrou na delegacia de polícia um boletim de ocorrência contra o desembargador em 2019.
— Aconteceu algo que tive que parar na delegacia da mulher e, depois disso, depois de tanto choro, eu voltei para casa achando que tudo ia ficar bem, com a esperança que tudo ia ficar maravilhosamente bem. Mas não aconteceu isso — disse ela em uma audiência para ratificar a denúncia.
Conforme o Superior Tribunal de Justiça (STJ), por diversas vezes, Caníbal ameaçou a ex-esposa, que ele acusava de manter relação extraconjugal e de ter sido prostituta no passado. Ele dizia que contaria isso para "toda a sociedade" com o objetivo de humilhá-la. Também teria ameaçado interná-la em uma clínica psiquiátrica.
A ex-esposa disse que o magistrado também fez ameaças à sua integridade física e ameaçou os filhos – que não moravam com o casal – e o ex-marido dela. Em áudios gravados por ela entre junho e julho de 2019, o desembargador afirma que ela não sabia o que ele era capaz de fazer, fala em referência ao desejo da ex-esposa de querer ir tomar um café com o próprio filho em seu aniversário.
Ainda de acordo com o STJ, em um dos áudios, é possível ouvir o desembargador dizer que ele era o "poder". Em outra gravação, o magistrado atira objetos na direção da ex-esposa.
A ex-esposa do desembargador contou, ainda, que se sentia ameaçada pelo hábito que o magistrado tinha de andar armado. A Procuradoria Geral da República (PGR) afirma que ele teria em depósito 10 armas de fogo.
Por que a abertura de um PAD
Para Salise Sanchotene, conselheira do CNJ, há necessidade do órgão apurar as denúncias de violência doméstica em conformidade com as orientações normativas do CNJ.
O Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero é um instrumento à disposição da magistratura brasileira para que se elimine do judiciário brasileiro julgamentos carregados de preconceitos, de estereótipos e de repetição de desigualdade. Ele foi criado em 2021 e orienta os trabalhadores da Justiça a enxergarem e combaterem as discriminações e os desequilíbrios de gênero.
Em reforço à política de combate à violência de gênero, em julho deste ano, a Corregedoria Nacional de Justiça aprovou um protocolo de atendimento e de recebimento de denúncias de vítimas de violência doméstica contra membros do Poder Judiciário, entre eles, magistrados.