Um levantamento realizado pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM) aponta que eventos climáticos registrados no Rio Grande do Sul forçaram 391.777 pessoas a deixar suas casas entre os anos de 2013 e 2022. Os dados analisados, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da Defesa Civil, revelam ainda que 430 mil residências foram danificadas ou destruídas por eventos meteorológicos extremos.
Para ter ideia do tamanho do número: se todos os desabrigados e desalojados no Estado ao longo dos últimos 10 anos fossem reunidos em um município, esta seria a terceira maior cidade do Rio Grande do Sul — tomando por referência os dados do Censo de 2022.
É como se todos os habitantes de Canoas (347.657), na Região Metropolitana, e mais 44 mil pessoas tivessem que deixar suas casas. Apenas Porto Alegre e Caxias do Sul têm população maior que o contingente de pessoas afetadas pelo mau tempo no Estado entre 2013 e 2022.
No período analisado pela CNM, o RS foi o segundo Estado brasileiro com mais unidades habitacionais afetadas por desastres naturais, ficando atrás apenas de Santa Catarina — onde 485.748 residências foram atingidas.
A região sul do Brasil, que inclui ainda o Paraná, foi a mais impactada, respondendo por 46% das residências que tiveram de ser desocupadas, de forma temporária ou definitiva, por causa de intempéries climáticas no país. O prejuízo com estas ocorrências nos três Estados do Sul é estimado em R$ 3,9 bilhões.
Entidade defende maior integração entre instâncias federativas
Em todo o Brasil, 2,2 milhões de moradias foram atingidas nos últimos 10 anos por tempestades, vendavais, inundações, enxurradas e alagamentos. Quatro milhões e 200 mil pessoas de 2.640 municípios sofreram prejuízos. As perdas somam R$ 26 bilhões.
O estudo destaca ainda que, de acordo com estimativas do ano passado, ao menos 10 milhões de pessoas moram em áreas de risco no país.
— Como estão essas famílias? Era para haver um mutirão envolvendo União, Estados e municípios para achar uma solução. Porque o município é que fica depois, ali, para arrumar as ruas que foram devastadas — defende o presidente da Confederação Nacional dos Municípios, Paulo Ziulkoski.
Ziulkoski afirma categoricamente que os resultados do levantamento refletem anos de desassistência:
— Ocorreu o fato? Vocês sabem como é que funciona. Daquele minuto em diante, estão lá a prefeitura, a comunidade, as igrejas, todo mundo organizado por solidariedade: verificando se alguém está em óbito, como é que se socorre, como se tira as pessoas do lamaçal, fornecendo comida, colchão. Tudo isso é local. Ali não existe Estado nem União, que levam grandes tributos do Brasil. Depois de todo esse trabalho, eles contratam helicóptero para sobrevoar ou visitar a região atingida e prometer mil e uma coisas para depois não acontecer nada. O que vem para os municípios vem na forma de financiamento, tendo que pagar juros. Não há investimento nenhum.
O secretário-chefe da Casa Civil do governo gaúcho, Artur Lemos, responde à crítica feita pelo presidente da confederação elencando uma série de ações promovidas durante a passagem dos últimos ciclones pelo Rio Grande do Sul. Quase 5 mil cestas básicas, milhares de litros de água, kits de higiene e colchões, telhas e materiais de construção foram entregues pelo Estado. Lemos também cita a liberação, via Cartão Cidadão, de R$ 2,5 mil para famílias de baixa renda atingidas pelo fenômeno climático, realizada nesta sexta-feira.
Segundo o chefe da Casa Civil do RS, a resposta do Piratini aos ciclones se dá em três momentos distintos:
— Acredito que o presidente Paulo Ziulkoski, tendo em vista que a matéria trata dos últimos 10 anos, tenha se referido a outros governos e a outro momento. O governo presente é assim: agimos antes com os alertas, buscando que os municípios se preparassem; age durante com sistema logístico, distribuição, alocação de recursos do governo do Estado; e também age depois na recuperação das estradas, das pontes e no auxílio aos entes municipais.
Na avaliação da CNM, os prejuízos e os impactos sociais e econômicos poderiam ter sido minimizados por meio de políticas integradas de gestão urbana, habitação e prevenção do risco de desastres.
Lemos complementa destacando a importância do aprofundamento das informações repassadas pelas prefeituras para o governo do Estado.
— É importante mencionar que os municípios precisam e têm essa condição maior no sentido de ter o contato mais próximo da população, podendo nos disponibilizar dados cada vez mais refinados para que possamos ser mais efetivos nas políticas públicas — observa o secretário.
CNM considera política habitacional insuficiente
A confederação também cruzou dados dos 1.580 municípios brasileiros que estão no cadastro nacional de risco, tendo áreas suscetíveis a deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas, entre outros transtornos. A maioria deles está localizada na região Sul (49%) e no Sudeste (30%) do Brasil.
Ao longo do período analisado (2013-2022), 460 cidades que fazem parte dessa lista não puderam acessar recursos do Minha Casa, Minha Vida do governo federal. Para a entidade, esse cenário dificulta bastante o trabalho das prefeituras em acessar recursos para a promoção de habitação segura. A burocracia é um dos pontos assinalados como obstáculo para adesão.
— Eles têm que ter uma visão da prefeitura. São muitas exigências impostas ao município para começar a viabilizar a recuperação. É uma coisa interminável. Por isso vamos piorando cada vez mais esses dados — observa Paulo Ziulkoski.
A Confederação Nacional dos Municípios critica a meta do governo federal de entregar, através do programa, 3 mil residências novas para quem perdeu sua única moradia devido a desastres desde 1º de janeiro de 2023. De acordo com a CNM, a quantidade é insuficiente, porque apenas de janeiro a junho deste ano foram destruídas 4.775 casas em todo país.