A possibilidade de que quiosques, casas e restaurantes localizados nas orlas da Praia Grande e do Rio Mampituba sejam destruídos por decisão judicial, em Torres, no Litoral Norte, está mobilizando a comunidade local e autoridades estaduais preocupadas com prejuízos a moradores e à geração de trabalho e renda na cidade.
Uma audiência pública realizada na quinta-feira (29) por iniciativa da Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa colheu reclamações da população e de comerciantes contrários às ações apresentadas pelo Ministério Público Federal (MPF). Um apanhado das manifestações deverá ser encaminhado ao governo do Estado, à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e ao próprio Legislativo.
Proponente da audiência realizada na quinta, o deputado estadual Felipe Camozzato (Novo) sustenta que uma série de ações vem sendo proposta pelo MPF ao longo dos últimos anos envolvendo principalmente estabelecimentos comerciais localizados na orla da praia e do Mampituba. Entre eles se encontram alguns pontos conhecidos, como os restaurantes Cantinho do Pescador, Bora Bora, Regis Grill e lancheria Corujão, além de cerca de 15 quiosques no calçadão da beira-mar e próximo ao rio.
— O MPF passou a entender que a Praia Grande e o Mampituba têm características de área de preservação permanente, e começou a haver diversos processos buscando a demolição de quiosques localizados nesses pontos e indenização por danos ambientais — afirma o deputado.
Camozzato entende que as ações são excessivas e não têm deixado espaço para soluções intermediárias.
— São áreas com mais de 200 anos de ocupação humana. Há gente que trabalha há 30, 40 anos nos quiosques, e agora corre o risco de perder o trabalho e ainda ter de pagar indenização. Não pedimos que deixem tudo como está, mas que haja negociação para se chegar a uma saída mais razoável, em vez de comprometer o trabalho de várias famílias no município — argumenta o parlamentar.
Uma listagem de processos encaminhada a GZH pela advogada Juliana Cainelli de Almeida contabiliza 42 ações individuais que envolvem também moradias e casas de veraneio localizadas nas proximidades do Mambituba. O relatório aponta pelo menos 15 residências que podem ser afetadas.
— Defendemos que essa não é apenas uma questão de direito ambiental, mas também humanístico e social. Não é possível passar por cima disso — afirma Juliana, que defende alguns dos moradores incluídos nos processos e tem especialização em Direito Ambiental.
Já o advogado Alexandre da Silva Quartiero, que representa comerciantes dos quiosques, argumenta que os estabelecimentos têm características que deveriam garantir sua permanência:
— Estão localizados em regiões antropizadas (com atividade humana), densamente ocupadas. Estão construídos sobre o calçadão, não sobre as dunas, e suas atividades utilizam todos os serviços de infraestrutura urbana, como abastecimento de água, rede de colega de esgoto, coleta de resíduos comum e seletiva, rede de energia elétrica, além de destinar resíduos de óleo para empresas licenciadas. Ou seja, não geram passivo ambiental, estando em área consolidada.
Pelo menos um estabelecimento, uma peixaria, já foi removido por conta dos processos. GZH procurou contato com o MPF neste sábado (1º) por meio do telefone celular da assessoria de comunicação, mas não conseguiu contato até a publicação desta matéria. Na sexta-feira (30), o órgão publicou uma nota oficial no seu site em que argumenta que "não existe um pedido geral de retirada de quiosques da Praia Grande, em Torres, mas ações que são avaliadas caso a caso pela Justiça e cuja resolução, que pode inclusive resultar na demolição de uma construção irregular, depende das características e dos problemas encontrados" (leia a íntegra do texto logo abaixo).
Segundo Camozzato, o MPF não compareceu à audiência, que contou com representantes da comunidade, trabalhadores nos quiosques e representantes da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), entre outros participantes. Os comerciantes ameaçados de perder os locais de trabalho argumentam ainda que estão devidamente licenciados pela prefeitura.
O que diz a nota oficial do MPF
"O Ministério Público Federal (MPF) esclarece que atua em diversos casos relativos aos quiosques construídos na Praia Grande, em Torres (RS). Atualmente, nove ações tramitam na Justiça Federal do estado em diferentes instâncias do Judiciário. Há processo, inclusive, que já está em fase de execução de sentença.
O MPF abriu os primeiros inquéritos civis públicos sobre o tema em 2005. As ações judiciais foram propostas entre 2011 e 2016, e os pedidos feitos em cada ação levam em conta o caso específico e as irregularidades constatadas. Portanto, não existe um pedido geral de retirada de quiosques da Praia Grande, em Torres, mas ações que são avaliadas caso a caso pela Justiça e cuja resolução, que pode inclusive resultar na demolição de uma construção irregular, depende das características e dos problemas encontrados."