Márcio André de Jesus dos Santos, percussionista da banda Gurizada Fandangueira (que tocava na boate Kiss na noite do incêndio, em Santa Maria) disse que o uso de artefatos pirotécnicos era de conhecimento do dono da casa noturna, Elissandro Spohr, o Kiko. Foi um desses fogos de artifício que causou o incêndio da danceteria, matando 242 pessoas, em 27 de janeiro de 2013.
Márcio é irmão de um dos réus, o músico Marcelo de Jesus dos Santos, acusado de disparar o artefato que causou o incêndio. Assim como os outros integrantes da banda, Márcio tinha outra profissão, era motorista. O irmão dele, além de vocalista da banda, era azulejista.
O percussionista Márcio comentou que nem iam tocar naquela noite, porque tinham trabalhado muito durante o dia, “no pesado”. A banda tinha repertório de música sertaneja e gauchesca. Ganhavam pouco, cerca de R$ 50 por músico, mas ir na boate garantia divulgação, possíveis novos contratos. Decidiram ir.
O músico disse que, sempre que permitido, eram colocados fogos pirotécnicos (chamados sputnik) ao lado do palco. Dois disparavam com a primeira música. Depois de cinco músicas, faziam nova pirotecnia.
O juiz Orlando Faccini Neto, que preside o júri do Caso Kiss, quis saber se o sócio que gerenciava a boate, Elissandro Spohr, o Kiko, sabia que a banda usava artefato pirotécnico. Márcio assegura que ele sabia, até porque a banda já tinha tocado pelo menos outra vez na Kiss, com a mesma performance pirotécnica, falou o músico.
O magistrado perguntou se, caso o extintor tivesse funcionado, seria possível evitar a propagação do fogo. Márcio afirmou que sim, com um extintor grande, conforme avalia a partir de sua experiência num curso de prevenção de incêndio.
Márcio relatou todo o início do incêndio. Recordou que tudo começou quando foram tocar um chamamé. Luciano Bonilha Leão (produtor da banda, que também é réu) montou o sputnik, e o vocalista Marcelo de Jesus dos Santos se programou para disparar o artefato. Quando disparou, o teto da boate pegou fogo, “soube depois que era a espuma”. A banda imediatamente parou de tocar.
— Um rapaz pegou um extintor, pulou pelo balcão do bar e alcançou para o Marcelo. Não funcionou. Outra pessoa tentou usar. Também não funcionou. Tive uma sensação de impotência. Aí um dos rapazes disse: “Vamos sair, não tem mais o que fazer” — relatou.
Márcio falou que os músicos da banda começaram a sair em fila indiana e não tinham como ir mais rápido, devido ao fluxo de pessoas. Ele assegura que o irmão, Marcelo, ainda tentou retornar para ajudar.
— Ele só dizia: “E os guris, os guris?”. Estava meio bobo, desorientado. Consegui arrastar ele pra fora. Ele foi desmaiando, é um sujeito forte, pesado... Foi difícil. Olhei para trás e vinha uma onda de pessoas, como se fosse o mar. A gente não conseguia sair. Um segurança, o Everton, tentava arrastar as pessoas. Peguei ele pela canela e consegui chamar a atenção, ele nos conhecia. Fomos puxados. Foi muita tristeza, a noite mais triste da minha vida — recordou.
Márcio admitiu que não sofreu sequelas do incêndio. E disse que tem vontade de encontrar pais das vítimas para dar um abraço e passar a versão da banda sobre o acontecido.