Em mais uma investida para rever as regras sobre multas aplicadas contra crimes ambientais, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, determinou novas mudanças no processo de apuração dessas autuações. Agora, as infrações terão de passar por autorização de um superior do agente de fiscalização que aplicar a punição, antes de serem confirmadas, passando por fases que, até então, incluíam a tramitação anterior com os próprios fiscais.
Hoje há cerca de 130 mil processos de infração ambiental no Ibama, que somam aproximadamente R$ 30 bilhões em multas. A publicação das mudanças ocorre no momento em que Ricardo Salles é acusado pelo chefe da Polícia Federal no Amazonas, Alexandre Saraiva, de atuar para favorecer madeireiros ilegais e grileiros de terras. O ministro não quer comentar o assunto.
As alterações nas regras sobre multas foram publicadas ontem em uma Instrução Normativa Conjunta assinada por Ricardo Salles e pelos presidentes do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, e do Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio), Fernando Lorencini.
A avaliação de especialistas é de que a nova norma dá mais poder de decisão sobre as multas às "autoridades hierarquicamente superiores", ignorando procedimentos anteriores que devem ser realizados pelos próprios fiscais. Além disso, prevê prazos mínimos de cinco dias para análises de infrações administrativas, o que praticamente inviabiliza o trabalho, dada a complexidade de muitas autuações.
—A instrução normativa recém-publicada reduz a autonomia dos fiscais sobre a lavratura dos autos e concentra poder em um superior hierárquico não definido— avalia a especialista sênior da organização Observatório do Clima, Suely Araújo.
Ex-presidente do Ibama, ela afirma que o texto elimina a atuação da equipe de fiscais e a fase de análise de conformidade jurídica antes da realização de audiência de conciliação com o autuado. Pela nova regra, essa análise será realizada pelos próprios conciliadores.
"Além disso, a instrução normativa estabelece prazos inexequíveis. O prazo de cinco dias consta em vários dispositivos. A intenção parece ser, no futuro, punir os próprios servidores, porque o governo sabe que esses prazos não serão cumpridos", explicou. De forma geral, a avaliação é de que o texto agrava os problemas do decreto que criou a conciliação ambiental - o de n.º 9.760/2019.
—Mas a intenção é esta mesmo: o desmonte da política ambiental e de seus instrumentos— comentou a especialista.
Questionado, Ricardo Salles negou que as mudanças vão engessar o trabalho dos agentes.
— Não é nada disso. Quem faz a confirmação dos atos é o diretor técnico ambiental. Já é assim hoje em dia, porém sem prazo— declarou.
O Ibama não divulga dados, mas o Estadão apurou que milhares de multas estão prescrevendo todos os dias porque os processos estão paralisados.