De ferro fundido, a máquina de costura, com uma chapa de aço que indica a patente de 1894, é herança da avó materna. Costureira com 10 filhos, ela utilizava o equipamento para fabricar roupas para a mãe de Mônica Inês Schuck e para os nove tios da professora de inglês.
O equipamento do século 19, protegido por uma caixa de madeira no apartamento da neta, voltou à ativa em 2020, e por uma razão nobre: reaproveitar sacos de ração que iriam parar no lixo, transformados em mochilas, estojos e ecobags que terão como destino o transporte dos materiais escolares de crianças carentes da rede pública de Santa Cruz do Sul, no Vale do Rio Pardo.
– Eu fiz isso, foi minha ideia. Ficou bonito, né? - diz Mônica, com orgulho, enquanto observa o material finalizado.
Aos 53 anos e tutora de três vira-latas, Nina, Suzy e Otti, a docente teve a ideia de utilizar o material descartável quando estava na fila do caixa de um supermercado do município. Avistou, ao lado do atendente, uma bolsa de pano, remetendo à lembrança do estoque de pacotes de comida animal que se acumulavam em uma agropecuária, também localizada nos arredores. E voltou ao comércio de suplementos.
– Me disseram que em geral isso era enchido com lixo. Pedi para levar para casa. Era até um favor para eles – relembra.
Mantendo o isolamento da embalagem, colada na base e nas laterais, a professora explica que o trabalho exige perícia apenas na abertura superior das sacolas. Um bolso externo foi costurado para expandir a utilidade do acessório.
Para as mochilas, o manuseio exige cuidado maior com o fecho, e a inclusão de uma tira de pano para costura do zíper.
A estampa das ecobags conserva as imagens dos animais, fotogênicos cãezinhos escolhidos pelas agências de publicidade que atendem as marcas de rações.
Há ainda uma versão feita a partir do mesmo material interno, mas com uma cobertura extra de pano xadrez, e pequenos gatos - retirados dos sacos de ração - colados na sobrecapa.
A produção, que até o momento tem quatro mochilas e sacolas, além de dois estojos, ganha novas sugestões de quem é apresentado à iniciativa: uma mateira, suporte para cuia e garrafa térmica, deve ser o próximo item da lista.
A educadora elenca dois objetivos como os primordiais do projeto: uma parceria que entregue gratuitamente os objetos a estudantes da região, e o incentivo à costura caseira de novos produtos a partir de material que seria descartado.
– Qualquer um pode fazer, não exige ter máquina ou experiência. É simples e ajuda a natureza - reforça Mônica, que pode ser contatada pelo Facebook.
Nas ruas, as sacolas impermeáveis passaram a ser item indispensável para a professora, que há tempos deixou de usar sacos plásticos para carregar as compras. Quem vê, elogia o produto, e sugere que eles sejam comercializados, como um complemento de renda aos artesãos.
Uma escola de alemão da cidade contatou Mônica e propôs uma campanha: os alunos fornecem a matéria-prima e a costureira devolve em forma de pastas retangulares. Além de ganharem o brinde, os estudantes são incentivados a reutilizar o plástico.
O grupo de escoteiros de Santa Cruz do Sul também comprou a ideia, através da esteticista e influencer digital Gabriela Xavier, 36 anos.
– Quando eu vi o que a Mônica está fazendo, uma ideia linda e de sustentabilidade, eu trouxe para cá, para que cada escoteiro possa fazer isso dentro de casa - explica a blogueira, também escoteira sênior.
No amplo espaço arborizado, outro projeto sustentável é tocado pelos lobinhos - como são chamados os mais jovens aventureiros -, segundo a voluntária Carmen Koehler, 64 anos: o Almofadas do Bem, que recicla panos de guarda-chuvas quebrados, usados como capas para travesseiros e caminhas de cachorro.
Há ainda a confecção de pequenos apoios para a cabeça, que ocupam pouco espaço e são usados nos acampamentos. O forro é composto por fibra, doação de uma fábrica de próteses ortopédicas. Os produtos são entregues mediante a troca por um pacote de ração, que é encaminhado à protetores dos animais na região.
– Já entregamos mais de 200 quilos de ração a pessoas que resgatam ou que cuidam dos bichinhos na rua - afirma Carmen.