Alvo de questionamento por parte de familiares de vítimas da tragédia na boate Kiss, em Santa Maria, a marcação do júri dos réus em duas etapas e em datas separadas teve como motivo a preocupação com o "desgaste físico e psicológico" de todos os envolvidos no processo. A afirmação é do juiz responsável pelo caso, Ulysses Louzada, que concedeu entrevista ao Grupo RBS na tarde desta terça-feira (15).
— O fato que realmente levou a cisão foi o desgaste físico e psicológico de todos atores processuais em razão do número expressivo de pessoas que seriam ouvidas, a maior parte já ouvida na primeira fase. Além disso, a duração do julgamento, que pode levar vários dias, testemunhas e jurados sem poderem se comunicar neste período também, embasaram minha decisão. Lá no final, quando os jurados tiverem que decidir, claro que estarão cansados. Por isso, quanto mais conseguirmos reduzir o desgaste físico e mental para para todos nós, melhor será. Mais perto de um julgamento correto e justo a gente vai ter — destacou Louzada.
O futuro dos quatro réus será definido em dois julgamentos. Marcelo de Jesus dos Santos e Mauro Hoffmann serão julgados no dia 16 de março de 2020, às 10h. O segundo júri, de Elisandro Spohr e Luciano Bonilha Leão, ocorrerá em 27 de abril de 2020, às 10h.
A escolha de quais réus seriam julgados juntos, segundo ele, foi baseada em "teses conflitantes entre os próprios defensores". Ele acrescenta:
— Iam acabar discutindo mais entre eles do que com a própria acusação. Para que isso não ocorresse eu decidi dessa maneira, para que possam discutir de maneira mais ampla e plena.
O magistrado afirma que cada etapa pode levar de 10 a 15 dias de duração. Com relação a isso, ele explica que, para poder realizar o júri, uma logística complexa está sendo montada. Isso inclui, inclusive, a abertura de uma licitação:
— Estou trabalhando atualmente mais na via administrativa, que talvez seja igualmente cansativa, como a jurisdicional. Temos várias reuniões aqui e em Porto Alegre para definir toda a logística. É muita coisa envolvida. Abrimos uma licitação porque teremos que locar hotéis, vamos ter que chamar oficiais de Justiça de outras comarcas para nos ajudar, precisaremos do apoio também das polícias rodoviárias, porque teremos deslocamento.
Louzada adianta ainda que um local está sendo buscado em Santa Maria para a realização do júri. O espaço deverá contar com 350 lugares, conforme o despacho do juiz emitido na segunda-feira (14).
O juiz também falou sobre um outro questionamento da Associação de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM), que diz respeito à limitação do número de testemunhas. A questão, inclusive, deve ser motivo de recurso do Ministério Público, conforme o órgão informou à reportagem ainda na terça-feira (15):
— Podemos trabalhar isso até o momento do julgamento. A maioria das testemunhas que foram arroladas já deram seus depoimentos no processo, que foram colhidos lá na instrução. É uma coisa que pode se discutir depois. Obrigatoriamente eu precisava dar uma resposta, e foi o que fiz.
O incêndio na boate Kiss matou 242 jovens e deixou mais de 600 pessoas feridas em janeiro de 2013.