Depois de 40 dias, um dos crimes mais violentos dos últimos anos em Caxias do Sul segue sem explicação ou identificação oficial das vítimas. Em 11 de junho, dois homens e duas mulheres foram baleados e queimados dentro de uma casa na Rua João D'Andréa, no bairro Pioneiro. Os primeiros indícios apontam que o local era utilizado como ponto de tráfico e teria sido alvo de um ataque de uma facção rival. A Delegacia de Homicídios trata o esclarecimento das mortes como prioridade, mas a complexidade do caso requer técnicas de investigação que demandam mais tempo. Uma das estratégias é identificar as movimentações e modo de ação de grupos criminosos na cidade, o que inclui o avanço na Serra de um grupo de Porto Alegre.
– A motivação, provavelmente, é a disputa de território pelo tráfico de drogas. Estamos trabalhando, mas está bem complicado. Pelo modo ocorrido, é provável o envolvimento de facção criminosa e, nestes casos, é comum não ter testemunhas, pois as pessoas tem medo de colaborarem. Temos outros meios (de investigar), mas levam mais tempo – comenta o delegado Rodrigo Kegler Duarte.
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O incêndio premeditado pelos criminosos é visto pela investigação como uma forma de extinguir aquele ponto de tráfico - o que reforça a versão do ataque decorrente de uma disputa entre facções. Outra possibilidade é de que o fogo foi utilizado para destruir alguma prova.Perícias confirmaram que os criminosos jogaram algum tipo de combustível no corpo das vítimas. O estado carbonizado impossibilitou a identificação e o único meio é pela comparação genética com possíveis familiares, contudo um exame de DNA demora entre 60 dias e 90 dias, conforme o Instituto Geral de Perícias (IGP).
Quarta vítima
A Delegacia de Homicídios acredita que a quarta vítima da chacina é Adriano Slongo, 34 anos. A mãe dele foi localizada pelos investigadores, prestou depoimento e cedeu material para comparação genética. Natural de Maximiliano de Almeida, Slongo foi dado como desaparecido desde o dia dos assassinatos. Ele tinha diversas passagens na polícia, principalmente em Erechim. Sua ficha inclui dois homicídios, receptação, posse ilegal de arma de fogo e roubo. Em Caxias do Sul, Slongo havia sido preso por receptação no bairro Planalto, em outubro de 2015.
"Quantos mais precisam morrer?"
Familiares de possíveis três vítimas procuraram a Polícia Civil nos dias seguintes ao incêndio. Eles têm certeza que os mortos na chacina era Anderson Teixeira Maciel, 17 anos, a mãe dele, Tatiane Teixeira, 36, e a namorada do rapaz, Emily Conceição da Silva, 16. De acordo com Julio Vaz Rodrigues, que é tio de Tatiane, Anderson seria dependente químico e as duas mulheres teriam ido atrás dele para impedir que ele comprasse drogas naquela noite.
– Estamos aguardando a polícia, mas eles só dizem que têm que esperar, que o DNA demora. Eu vi os corpos, realmente não tinha como reconhecer. Mas temos certeza que são eles – relata.
Moradores de outra região da cidade, os familiares de Emily têm dificuldades de entender o que aconteceu. Enquanto a polícia fala em disputa do tráfico, eles lembram da jovem de 16 anos que estudava e buscava uma vida melhor. O namorado, Anderson, passava dias na casa dos pais do garota. Ele não apresentava ter inimizades ou qualquer outro problema, principalmente em relação ao uso de drogas.
– Não sabemos o que aconteceu e esperamos que a polícia resolva. A gente tenta acompanhar, mas ninguém nos fala nada. O corpo está sob custódia do governo e a família como fica? Não temos direito a nada, nem enterro ou velório. Estamos presos esperando esse DNA. Parece que, por sermos uma família humilde, ninguém se importa. A Emily tinha gente por ela. Estamos aqui e estamos sofrendo – reclama uma familiar que prefere não ser identificada.
Sobre as hipóteses para a chacina, a família de Emily aponta o descaso do Poder Público com os bairros mais pobres e o cenário de impunidade no país.
– Dizem que (a casa) era um ponto de tráfico conhecido da polícia. É conhecido e ninguém faz nada? Quantos mais precisam morrer? Criminosos tiram a vida de quem não conhecem. Está acontecendo todos os dias, nós vemos na televisão. É violência e mais violência. E ninguém faz nada? Nunca terá fim? – questiona uma parente da adolescente.