Com os gritos de "queremos aula" e "queremos micro" ao fundo, ficava difícil ouvir a voz da integrante da coordenação da Rede Integrada de Proteção à Criança e Adolescente do Arquipélago, em Porto Alegre, Beatriz Gonçalves Pereira, 53 anos, durante entrevista ao Diário Gaúcho. Ela, que é moradora da Ilha da Pintada, junto com pais e alunos da Escola Estadual de Ensino Fundamental Oscar Schmitt, fizeram uma manifestação na manhã desta quarta-feira em frente à instituição. O protesto era contra a falta de transporte escolar.
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Sem apoio da Secretaria Estadual da Educação (Seduc), os manifestantes fecharam a BR-290 por volta das 10h45min, impedindo a passagem de veículos. A Polícia Rodoviária Federal (PRF) esteve no local e, segundo Beatriz, a conversa foi pacífica. A reportagem tentou contato com a assessoria de imprensa da PRF, mas não foi atendida. No Twitter, o órgão colocou uma imagem informando sobre a interrupção do trânsito no quilômetro 101 da rodovia por conta do protesto. Ao meio-dia, a pista foi liberada.
Sem ônibus há 60 dias, cerca de 150 das 311 crianças que frequentam a Oscar Schmitt estão sem ir às aulas desde o início deste ano letivo. Além destas, crianças e adolescentes de outras três escolas das ilhas – Escola Estadual de Ensino Fundamental Alvarenga Peixoto, Escola Estadual de Ensino Fundamental Maria José Mabilde e Escola Estadual de Ensino Médio Almirante Barroso – também estão sendo prejudicadas pelo problema.
Moradoras de locais de difícil de acesso, muitas em sítios e do outro lado da BR-290, as crianças não têm outro meio de chegar às escolas sem o transporte que, até 2016, era oferecido pela Seduc. Passadas as férias, as famílias foram pegas de surpresa quando começaram a notar, dia sim, outro também, que o coletivo escolar não passava nas paradas de referência.
– Algumas crianças, para não perder a aula, se arriscam a atravessar pela BR e ponte móvel, correndo o risco de serem atropeladas. Outras chegam a caminhar 5km para chegar na escola. Os direitos desses estudantes estão sendo violados, não aguentamos mais essa situação – desabafa Beatriz.
Ela conta que as direções das escolas, pais e a própria Rede fizeram reuniões com a Seduc, inclusive levando a questão de que essas crianças vêm de famílias de baixa renda e não têm condições de pagar um transporte particular. Entretanto, as respostas não foram positivas.
– Já esgotamos nossas possibilidades de ajuda, por isso partimos para o protesto, para ver se, dessa forma, o governo resolve. Alguns alunos não foram nem um dia na escola ainda, neste ano, e depois a Seduc quer cobrar dos pais que eles estejam na escola. Mas como eles irão? A questão chegou no ponto do insuportável – diz Beatriz.
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Não há prazo para volta do transporte escolar
Diferentemente do informado por Beatriz, a Seduc afirmou que os alunos da escola Maria José Mabilde não necessitam de transporte escolar. As demais, sim, e estão prejudicadas pela falta do ônibus.
A assessoria do órgão explicou que foram feitas três licitações para contratação de transporte escolar na região das Ilhas. No último processo, a empresa vencedora apresentou a documentação, que está sob análise do Departamento Jurídico da Seduc. Somente após a verificação dos documentos, o departamento determinará se a empresa atende aos critérios e à legislação para operar o serviço. Entretanto, não há prazo para a finalização deste processo e, portanto, para que o transporte escolar volte a atender os estudantes.
Quanto à recuperação das aulas perdidas, a Seduc informou que, após a retomada dos estudos, cada escola fará um novo calendário para compensar os dias parados. Esse plano deverá ser aprovado pela 1ª Coordenadoria Regional de Educação que, pela lei, estabelece 200 dias letivos a serem cumpridos.