Com a promessa de terem uma casa própria, 46 famílias de Canoas vivem há cerca de quatro anos na Vila de Passagem, Bairro Fátima – com a expectativa de que ficariam no máximo um ano por lá. Sem assistência da prefeitura nem perspectivas de quando o sonho se tornará realidade.
Quatro vielas abrigam cerca de 200 pessoas em módulos de uma peça e um banheiro que deveriam ser casas, mas estão em condições precárias. Telhados quebrados, furos nas paredes, lixo acumulado em vários pontos, esgoto vazando dentro e fora dos casebres, ratos e baratas. A auxiliar de cozinha Daniela Melo Barcellos, 19 anos, que mora há cinco anos na vila e viu as duas filhas nascerem nesta precariedade, conta que, na semana passada, matou três cobras que apareceram depois das chuvas.
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– É sujeira para todo o lado, não importa o quanto a gente tente manter as casas limpas. Os bichos entram, porque o esgoto está sempre estourado. Nossas crianças estão em constante risco de pegar alguma doença – reclama Daniela.
De malas prontas
Na manhã de ontem, quando a reportagem visitou a vila, os moradores estavam sem água desde a madrugada. Outro problema que, segundo a comunidade, é recorrente. A dona de casa Albertina Fernandes, 58 anos, é a moradora mais antiga da Vila de Passagem. Há quase seis anos vivendo na área, queixa-se do abandono e descaso das autoridades.
– Eu morava numa invasão aqui em Canoas, a prefeitura me tirou de lá há seis anos prometendo que eu seria contemplada com uma casa. Não aconteceu. Morei no meio mato com meu filho por um tempo antes de vir para cá, mais uma vez com a promessa de ter meu cantinho. Estou esperando até agora. Não tenho mais esperança – diz Albertina.
Quando recebeu a notícia de que começaria 2017 de casa nova, Rita de Cassia Santos dos Santos, 36 anos, junto com seus oito filhos, fez as malas para ir para a casa nova. Depois da invasão do conjunto habitacional onde foram contemplados com as moradias, não teve coragem de desfazer as sacolas e pede que a prefeitura dê atenção a situação dela e dos vizinhos.
– Nossas coisas já estão todas guardadas, só esperando o dia da mudança. Só quero um lugar digno para dar uma vida melhor pras minhas crianças.
Invasão e demora
A dona de casa Jacinara Machado, 42 anos, mostrava indignada o comprovante de que ela é dona de uma das casas do residencial MQ4 Guajuviras, que faz parte do programa Minha Casa Minha Vida. Assim como ela, a maioria das famílias da Vila foram contempladas com imóveis no macroquarteirão.
– A gente foi conhecer as casas, escolher, ficamos encantados e cheios de alegria. A prefeitura disse que, no início desse ano, já poderíamos nos mudar. Aí, poucos dias antes da data marcada para irmos, invadiram o MQ4. É muito triste – desabafa Jacinara.
Sem acreditar
Na noite de 2 de janeiro, mais de três mil pessoas entraram sem autorização em casas do condomínio, na Avenida do Nazário, Bairro Guajuviras, que estavam quase prontas – e que seriam entregues às famílias da Vila de Passagem. O grupo integra movimentos de trabalhadores sem teto e segue nas moradias.
Segundo a dona de casa Alexandra Leal Menezes, 20 anos, a próxima data prometida pela prefeitura para a transferência das famílias para suas moradias fixas é entre 13 e 17 de março. O problema é que a comunidade não acredita mais no governo.
– Eles já deram tantos prazos que a gente não acredita mais. Faz seis meses que não aparece ninguém da prefeitura por aqui, nem pra falar com a gente, nem pra recolher lixo ou limpar os esgotos, pra nada – diz ela.
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Transferência prometida para março
A Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação de Canoas informou que as casas do MQ4 Guajuviras serão desocupadas entre 13 e 17 de março. Há previsão de liberação de 30 imóveis por dia. A comunidade da Vila de Passagem será priorizada na mudança.
Assim que o macroquarteirão for liberado, as 46 famílias contempladas no programa de habitação poderão ir para suas casas e a Vila de Passagem será extinta.
Diferentemente do que os moradores relataram, a prefeitura disse que, desde 1° de janeiro, quando a nova administração tomou posse, vem realizando ações como uso de hidrojato nos esgotos na Vila de Passagem. O acúmulo de lixo e proliferação de animais se deve, também, aos processos de reciclagem feita por alguns moradores.
Produção: Shállon Teobaldo