A mão trêmula segurando o isqueiro para tentar botar fogo nas cinzas de cigarro. Cinzas que derreteriam os pequenos fragmentos de pedras amareladas no cachimbo improvisado com pedaços de cano de água e de alumínio para filtrar a fumaça.
Enquanto isso, ele me contava: "Negão, bah, cada tentativa de acender a brasa detona meu dedo, mas a dor por não ter a paulada da pedra no melão é bem pior. Amigos? Aqui, não existem. Porque, embaixo do viaduto que estou, tenho o tesouro mais desejado e aqueles que fazem mãozinha comigo para adiantar as caminhadas, de uma hora para outra, viram meus maiores inimigos e abririam minha garganta e levariam minha brita. Ontem, eu me dei no bagulho. Consegui atravessar a rua e, por sorte, trombei um coroa que me lançou dez pila, o que foi lucro. Às vezes, olho a pedrinha e, por uma fração de segundos, penso como algo tão pequeno me domina tanto. Penso como seria jogar essa porcaria no lixo, mas essa ideia chega a dar ânsia de vômito. Só a pedra pode fazer essa dor que sinto passar. O irônico é que, sem essa pedra, a dor não existiria. Quando tomo coragem e tento ver meus sobrinhos para ver se consigo sair daqui, meus irmãos me tratam como bicho. Mas entendo, por R$ 25, quase matei um deles com a faca na virada do ano. Queria ter força para mudar, mas não consigo. Aê, negão, vou largar porque esse isqueiro tá quebrado".
Consequências
Alguns jovens são guiados pela lógica do "não dá nada". O problema é que, quando veem que estavam errados, já é tarde demais.
Esse com quem conversei é um dos milhares de usuários de crack que temos no Estado. Depois de ler este texto, mostre ao seu filho e pergunte o que ele acha da vida desse rapaz.