Chegou ao fim o mais longo processo de cassação de um deputado na Assembleia. Após 384 dias de disputa na Justiça e no parlamento, 51 deputados decretaram o fim do mandato do ex-jogador Mário Jardel (PSD), acusado de quebra de decoro. Tendo o deputado federal Danrlei (PSD) como cabo eleitoral, Jardel foi eleito em 2014 com 41 mil votos.
Alegando estar em depressão – fato que já foi invocado por ele outras vezes ao longo do último ano –, o ex-atleta foi condenado sem se defender pessoalmente das acusações de que empregou funcionária fantasma e falsificou diárias. Na quinta-feira, o advogado de Jardel também não apareceu na Assembleia para dar explicações no plenário.
Leia mais:
Jardel entrega documento para deputados pedindo "análise criteriosa" de sua cassação
Assessores de Jardel são demitidos da Assembleia
Comissão de Ética da AL aprova relatório que recomenda cassação de Jardel
A sessão de cassação do deputado foi semelhante à que retirou o mandato de Diógenes Baségio (PDT) em 2015 – acusado de manter funcionários fantasmas.
Em clima de consternação, os parlamentares se revezaram na tribuna para declarar voto contra Jardel e alertar os eleitores para os riscos de eleger celebridades para cargos públicos. Presidente da Comissão de Ética, Juliano Roso (PC do B) disse que o momento era "triste":
– É triste para a Assembleia e para a política do Rio Grande do Sul. Isso precisa ficar claro para a sociedade. Não estamos felizes nem realizados por fazer algo dessa natureza. É o segundo deputado cassado nesta legislatura. Lamento pelos eleitores de Jardel. Esse é um ato derradeiro, cruel e traumático, mas que tem de ser feito.
A defesa de Jardel, representada pelo advogado Rogério Bassotto, não compareceu à sessão. A justificativa do defensor do deputado é de que não foi intimado do julgamento em plenário.
– Não fomos intimados para depor. Essa é mais uma nulidade do processo. Vamos seguir buscando reverter a decisão na Justiça – afirmou.
O procurador da Assembleia, Fernando Ferreira, contesta a informação de Bassotto e garante que tanto ele quanto Jardel foram informados:
– Lamento que, mais uma vez, a defesa insista na tese de fugir e depois alegar que não sabia. Foram enviadas mensagens para o deputado, para o seu ex-chefe de gabinete e para o advogado. Temos todas as provas.
Jardel não foi localizado pela reportagem para comentar a decisão dos colegas. Segundo o seu advogado, o deputado está em Fortaleza (CE) com a família.
O processo de cassação de Jardel em 10 atos
29 de novembro de 2015 – O Ministério Público Estadual deflagra a Operação Gol Contra, com o deputado Mário Jardel (PSD) e membros do seu gabinete como alvos. São feitas buscas na residência do ex-jogador, que é afastado judicialmente do cargo parlamentar. As denúncias apuradas dão conta de que Jardel estaria exigindo parte do salário dos funcionários, teria falsificado diárias e comprovantes de reembolso de combustível, além de financiar o tráfico de drogas com dinheiro público.
3 de dezembro de 2015 – A Comissão de Ética da Assembleia abre investigação sobre a possível quebra de decoro por parte do deputado na Operação Gol Contra.
23 de dezembro de 2015 – O relatório do corregedor da Assembleia, Marlon Santos (PDT), é aprovado por unanimidade pela Comissão de Ética da Casa e é aberto o processo de cassação do deputado Mário Jardel (PSD). No documento, Marlon afirma que o parlamentar foi "agente direto, partícipe contumaz dos atos, e tudo envolve ele e alguns de seus assessores e ex-assessores diretos", quando refere-se às suspeitas envolvendo o deputado.
18 de abril de 2016 – Em meio ao processo de cassação, enquanto diversas testemunhas eram ouvidas e os deputados tentavam agendar o depoimento de Jardel, o parlamentar pede licença-saúde de 30 dias para tratar depressão.
8 de junho de 2016 – A subcomissão de Ética que analisava a situação de Jardel faz relatório pedindo a cassação do deputado. O documento é aprovado por unanimidade e o Projeto de Resolução (PR) que declara a perda do mandato parlamentar é enviado à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), onde também é aprovado.
5 de julho de 2016 – Minutos antes de entrar em votação no plenário, o Projeto de Resolução (PR) que declara a perda do mandato de Jardel é retirado da pauta por decisão judicial. Uma liminar do Tribunal de Justiça (TJ) acolhe pedido da defesa, que alegava que o deputado não tinha sido ouvido no processo.
15 de agosto de 2016 – Em julgamento no TJ, o pleno da Corte decide que o processo de Jardel é nulo por ele não ter sido ouvido.
14 de outubro de 2016 – A Comissão de Ética reinicia o processo a partir do momento em que Jardel deveria ser ouvido. O deputado é notificado para depor, mas não comparece alegando que a avó está doente.
7 de dezembro de 2016 – Por unanimidade, a Comissão de Ética aprovou o novo relatório da Subcomissão Processante que orienta a cassação de Jardel (PSD).
22 de dezembro – Após mais de um ano da abertura da investigação, Jardel enfim é cassado pelos deputados. No total, 51 votaram a favor da cassação e nenhum contra.
O substituto
No lugar de Jardel, assumiria o primeiro suplente da bancada do PSD, Tarcíso Flecha Negra. No entanto, como foi eleito vereador para a próxima legislatura em Porto Alegre, optou por permanecer na Câmara. Com isso, a vaga ficará com Eduardo Olivera.
Olivera tem 40 anos e é natural de Santana do Livramento. Advogado, pós-graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho, começou a carreira política no movimento estudantil, nos anos 1990, e foi vereador no município da Fronteira Oeste pelo DEM por quatro mandatos, tendo sido eleito pela primeira vez em 2000. Olivera foi um dos fundadores do PSD no Estado. Na última eleição, concorreu a deputado estadual, fez pouco mais de 9 mil votos e ficou como segundo suplente da coligação Rio Grande Unido Pode Mais (PSD, PHS, PT do B, PSDC e PSL). Se manteve no cargo de secretário de Modernização Administrativa e dos Recursos Humanos do Estado do governo José Ivo Sartori até junho deste ano, quando saiu para concorrer à prefeitura de Santana do Livramento, cargo ao qual não se elegeu.