Em qualquer conversa sobre economia, virou lugar-comum citar Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul como exemplo de descontrole nas contas públicas. Atrasos nos salários, déficits bilionários e colapso iminente na Previdência aproximam como nunca a situação financeira dos dois Estados. Num intervalo de duas semanas, ambos os governos lançaram pacotes na tentativa de alívio na agonia contábil.
Embora a crise tenha origens distintas, as soluções apresentadas têm conteúdo semelhante e efeito reduzido no curto prazo. Enquanto o Piratini estima fechar o ano com buraco de R$ 2,3 bilhões, o Palácio Guanabara enfrenta rombo quase oito vezes maior: R$ 17,5 bilhões.
No Rio, o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) anunciou as medidas de combate à crise em 4 de novembro, projetando impacto de R$ 13,3 bilhões em 2017 e de R$ 14,6 bilhões em 2018. Aqui, os estudos feitos pela equipe de José Ivo Sartori (PMDB) mostram ganho anual no fluxo financeiro de R$ 2,6 bilhões e economia de R$ 6,7 bilhões em quatro anos.
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Nos dois casos, as iniciativas convergem para aumento da contribuição previdenciária, extinção de órgãos públicos e redução no repasse do duodécimo aos demais poderes. O Rio quer cortar altos salários e programas sociais, demitir detentores de cargos em comissão e elevar alíquotas de ICMS – medida já tomada pelo Piratini. Sartori pretende privatizar quatro estatais, alternativa cogitada por Pezão mas ainda não levada a cabo.
– São Estados muito importantes na política e na economia nacional, mas que passam por uma situação dramática. Só que, para resolver o problema, é preciso mexer na estrutura, e isso significa mudanças profundas no sistema previdenciário. Privatizações e cortes ajudam, mas são paliativos diante do cenário de longo prazo – avalia o economista Fernando Ferrari.
Enquanto o Rio Grande do Sul percorre um caminho tortuoso há décadas – amargando déficits em 38 dos últimos 45 anos –, o Rio de Janeiro até pouco tempo esbanjava dinheiro. A bonança levou o governo passado a conceder reajustes acima da inflação ao funcionalismo, receita seguida aqui pela gestão Tarso Genro (PT). Não tardou para o aumento nos gastos com a folha de pagamento ficar insustentável, tornando corriqueiros os atrasos nos salários.
No Rio, a gastança era financiada pelos royalties do petróleo. Maior produtor do óleo no país, o Estado perdeu R$ 9 bilhões em arrecadação somente em 2015, com a queda no preço do barril no mercado internacional. Mantido o atual panorama, Pezão diz que terá recursos para pagar apenas sete meses de salários em 2017.
Tão logo anunciou o pacote, o governador fluminense viajou a Brasília em busca de socorro federal. Não obteve um centavo e, no dia seguinte, viu o Tesouro Nacional bloquear R$ 140 milhões das contas estaduais em razão do calote em parcela da dívida com a União.
– Presidente, o Estado está ficando ingovernável – desabafou em telefonema a Michel Temer (PMDB).
Irmanados na desgraça, Sartori e Pezão têm conversado com frequência. Além de discutirem alternativas para pagar despesas como o 13º salário do funcionalismo, ampliaram o intercâmbio entre os técnicos fazendários. Uma equipe do Rio esteve em Porto Alegre colhendo informações sobre o sistema de cobrança de passivos tributários, que reverteu R$ 1,6 bilhão aos cofres gaúchos em 2015, enquanto no Rio não passa de R$ 300 milhões.
Outro problema compartilhado é a possibilidade de as propostas serem rejeitadas. No Rio, a Assembleia Legislativa já descartou nove das 22 medidas, inclusive a que previa o aumento da contribuição previdenciária de aposentados, que geraria economia de R$ 6,8 bilhões por ano.
As votações na capital fluminense também têm provocado manifestações barulhentas dos servidores públicos, com tumultos e prisões. Em Porto Alegre, o Piratini cogita convocar a Força Nacional para cercar a Assembleia quando os projetos forem apreciados em plenário.
*Colaborou Débora Ely