Em apenas trinta minutos, a minuciosa dedicação de anos da família Andres ao plantio e cultivo de flores foi comprometida pela enxurrada e pelo temporal. A propriedade de 2,5 hectares, às margens do Arroio do Ouro, no Vale Real, próximo a Caxias do Sul, perdeu cerca de 80% de sua estrutura quando o rio invadiu a lavoura e destruiu estufas, telas e o sistema de gotejamento, fundamentais para o crescimento saudável das flores.
Responsáveis por abastecer dezenas de lojas na Serra Gaúcha, além da Ceasa, em Porto Alegre, os agricultores estimam um prejuízo mínimo de R$ 500 mil. Metade da colheita de flores para o feriado de Finados foi embora com a água. Toda a safra de janeiro morreu em meio ao barro. Centenas de metros de telas, cujo m² vale R$ 8, viraram dejetos.
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– Ficou brabo, não sei mais o que vai dar. Está difícil. A gente ia mudar as estufas, fazer uma coisa mais ajeitada, e veio tudo isso. Temos de achar um meio de seguir em frente. Para ser sincero, eu nem desci para ver os estragos, é duro demais – lamenta o proprietário, Airton José Andres.
Com o pouco que conseguiu salvar, ele trabalhava em um galpão da propriedade, a 30 metros acima das estufas, sem encarar a realidade. Lá embaixo, o cenário era desolador. Os caminhos da plantação viraram barro, e o lodo tomou conta de centenas de mudas. O arroio, ainda alto, cruzava ao lado da lavoura com força e ameaçava inundar novamente se a chuva não cessar.
– Em outras épocas, não perdíamos canos, redes e telas. O que a enchente não levou agora, o vento estragou. Como estamos numa situação desesperadora, vamos priorizar os lojistas neste Finados – afirma Viviane Andres, filha de Airton.
Segundo ela, seriam vendidos em torno de 1.200 pacotes de crisântemo para o feriado. A comercialização serviria para capitalizar a floricultura para todo o ano de 2017. Agora, a família estima somente 600 pacotes para venda.
– A flor é delicada, é uma cultura que necessidade de cuidado, tratamentos, defensivos. Nunca sofri tanto, e olha que mexo com isso há muitos anos – diz Airton.
Para não quebrar, os Andres pretendem obter ajuda da prefeitura e empréstimos de bancos. Enquanto isso, pedem paciência aos clientes – inclusive aos que pretendem levar uma lembrança aos entes queridos no dia 2 de novembro.
– Vamos adiante com uma qualidade menor. Esperamos que as pessoas nos entendam – fala Viviane.
Destruição e prejuízos no interior de Caxias
Castigada por um volume de 207 milímetros de chuva em apenas quatro dias, a região de Caxias do Sul trabalha contra o tempo para reconstruir estradas, reparar lavouras e retirar a água que invadiu residências às margens do Rio Caí e do Arroio do Ouro. A partir do próximo domingo, há previsão de novas precipitações. Em Vila Cristina, a queda de duas cabeceiras da ponte entre Forqueta e Vale Real trouxe diversos transtornos para a circulação local. A RS-452 (foto abaixo), com enormes buracos, está praticamente intrafegável.
Metade dos alunos da Escola Dr. Renato Del Mese estão sem ir às aulas porque o transporte não consegue chegar até as casas para carrega-los. Quatro máquinas da subprefeitura de Vila Cristina, com apoio de veículos da prefeitura da cidade, vão desobstruindo, aos poucos, os caminhos vicinais. A prioridade é liberar todos os acessos e, então, contabilizar os prejuízos financeiros. Alguns produtores perderam quase tudo que tinham plantado nos últimos meses.
– O rio invadiu as lavouras e o pessoal que não tem estufa, a grande maioria, foi bastante afetado. Em Nova Palmira, o alface se foi praticamente inteiro. A safra do milho também está comprometida – avalia o subprefeito de Vila Cristina, Carlos Ramon.
Em Santa Lúcia do Piaí, a Estrada da Produção e a Estrada São Valentim necessitam de reparos urgentes para serem normalizadas. Já em Forqueta, a RGE tem dificuldades para chegar a algumas localidades, como a Menino Deus, para restabelecer a energia elétrica.
– Vamos precisar de um tempo para normalizar. Depois que cai uma barreira dessas, temos de fazer toda a parte de valetas para a vazão da água e o desentupimento. Focamos na acessibilidade, até para permitir o escoamento da produção. Hoje pela manhã um senhor falou que não conseguiu tirar o caminhão cheio de pêssegos da garagem – relata a subprefeita de Forqueta, Sandra Bonetto.
No distrito de Vila Oliva, terra, pedras e troncos trancaram a Estrada da Grota. Com a melhor do tempo, o serviço deve ser concluído ainda hoje. Nas regiões de Criúva, Ana Rech, Desvio Rizzo, Fazenda Souza, Galópolis e Vila Seca, a situação é considerada menos grave.