Vereadores e servidores de 12 Câmaras da Região Metropolitana percorreram 98 cidades em 1.514 viagens durante três anos e meio, uma média de mais de uma viagem por dia ao longo de todo o período. Porto Alegre é o principal destino de pagamentos de diárias. Ainda que todos os municípios pertençam à Região Metropolitana, 28% do total (425) de viagens pagas pelos legislativos são para trajetos até a Capital.
Nas Câmaras de Canoas, Eldorado do Sul e Alvorada, municípios que fazem limite com Porto Alegre, são pagas diárias para vindas à cidade vizinha. Na câmara de Alvorada, a segunda no ranking de gastos entre as cidades pesquisadas, a Capital é o destino mais comum. Foram 154 diárias para Porto Alegre, a um custo de R$ 119 cada.
Na Câmara de Eldorado, o vereador recebe R$ 70 ao se deslocar dentro da Região Metropolitana e R$ 140 quando há pernoite. No período, foram pagas 56 diárias para Porto Alegre. A Câmara de Canoas, que fica a 15km do Centro da Capital, paga R$ 100 para o vereador que vem a Porto Alegre, mas não pernoita. Foram 52 trajetos pagos até Porto Alegre nesta legislatura.
Leia mais
Vereadores da Região Metropolitana gastaram R$ 2,4 milhões com diárias de viagem desde 2013
Os 10 vereadores da Região Metropolitana que mais receberam diárias de viagem
Rosane de Oliveira: vereadores esbanjam dinheiro do contribuinte
As Câmaras de São Leopoldo e Novo Hamburgo não pagam diárias para quem faz este trajeto:
– Se vem a Porto Alegre não ganha nada. Nem passagem para o trem – diz a presidente da Câmara de São Leopoldo, Iara Cardoso (PDT). Na Câmara de Cachoeirinha, também não é paga diária para este trajeto.
Brasília é o segundo destino mais procurado pelos vereadores
Brasília-DF e São Paulo-SP ocupam o segundo e o terceiro lugares no ranking dos principais destinos. Até a Capital Federal, foram pagas 374 viagens, que ocorrem normalmente para cursos, atos solenes, visitas a ministérios e a deputados.
O legislativo que mais vezes foi a Brasília foi o de Gravataí: 94 viagens em três anos e meio, a um custo de R$ 894,15 a diária.As câmaras de Sapucaia do Sul e Esteio foram as únicas que abriram mão de viagens até Brasília no período. O presidente da Câmara de Sapucaia, José Carlos Dutra dos Santos (PMDB), justifica:
– Fizemos este acordo para não viajar mais. Se tiver que ir em Brasília com um pessoal para buscar recursos para a cidade, tudo bem, mas temos evitado.
local turístico não define ilegalidade
Das 20 cidades que concentram o maior número de viagens, metade são destinos turísticos conhecidos. Estas cidades sediam cursos, congressos e encontros nacionais de vereadores, promovidos principalmente pela União dos Vereadores do Brasil (UVB).
De acordo com a coordenadora de Consultoria Técnica do TCE, a auditora pública externa Fernanda Nunes, para tornar os eventos atrativos, muitas vezes, são escolhidos locais nos quais há interesse turístico, porque têm melhores hotéis e clima mais agradável.
– Mas isso não pode ser visto como um princípio de ilegalidade. O principal é olhar o conteúdo do evento, verificar se a empresa que está organizando é idônea, se realiza o evento há bastante tempo – explica.
Na capital, vereador não precisa de aprovação para viajar
A Câmara de Porto Alegre é a única da Região Metropolitana na qual o vereador não precisa de aprovação para viajar. Porém, o número de viagens, independentemente dos eventos ou dos destinos, deve estar dentro do limite anual de gastos estabelecido pela Câmara, que é de R$ 16.237,71 em diárias e passagens aéreas.
O presidente da Casa, Cassio Trogildo (PTB), explica que ao retornar da viagem o parlamentar presta contas na tribuna do que fez. Nas demais câmaras da região, a viagem passa por aprovação, seja do presidente do Legislativo, da mesa diretora ou do plenário.
A Câmara de Porto Alegre é a terceira da Região Metropolitana que mais gasta com diárias. Vereadores e servidores gastaram R$ 304.091,79 de janeiro de 2013 até junho de 2016. Só os parlamentares consumiram R$ 199.778,62 deste total. Dos 36 vereadores, 23 usaram diárias para viagem.
– O valor usado aqui é bem menor do que nosso regramento interno permite – analisa Trogildo.
Viagens para o exterior
Os vereadores da Capital foram os únicos do levantamento do DG a irem para fora do país. Em três anos e meio, fizeram 15 viagens para seis diferentes países. Os destinos percorridos no Exterior passam por San José, São Francisco e Washington, nos Estados Unidos, Barcelona, na Espanha, Buenos Aires, na Argentina, Milão, na Itália, Istambul, na Turquia, e Paris, na França.
Trogildo defende que as viagens fornecem elementos que enriquecem os debates da Casa:
– Isso está dentro do espectro das atribuições do parlamento. Para legislar e debater, tem que buscar subsídios.A vereadora Jussara Cony (PCdoB) foi a que mais gastou em diárias neste período: R$ 29.257,03 em 14 viagens – a maior parte delas para Brasília.
Ela argumenta que as viagens são investimentos em políticas públicas e que os eventos que participa são ligados aos principais focos de sua atuação da Câmara: saúde pública, mulheres, educação e reforma urbana.
– Tem coisas que se faz aqui e que se tem o dever de levar para outras instâncias. Tenho uma relação política para ir a Brasília, e em todo país, na dimensão de buscar políticas públicas para a minha cidade – avalia.
Vereadores de esteio optaram por não receber diárias
A Câmara de Esteio é a única dentre as pesquisadas pelo reportagem em que os vereadores não viajaram nenhuma vez entre 2013 e junho de 2016 com uso de diárias. Ao longo da legislatura, o gasto total da Câmara com diárias foi de R$ 3.073,77, utilizado apenas por servidores. Foram 26 viagens para Porto Alegre para cursos e treinamentos. Desde 2006, os vereadores de Esteio não utilizam gastos com diárias.
Diferentemente de tantos outros vereadores ouvidos pela reportagem, o presidente da Câmara de Esteio, Marcelo Kohlrasch Pereira (PSB), defende que não há necessidade de viajar:
– Simplesmente, os vereadores entenderam que tinham que enxugar o orçamento. É uma política da Câmara. Quanto mais enxuto for, mais vamos poder ajudar a população.
Se o vereador viajar, segundo Marcelo, deve usar o recurso do próprio salário. O salário bruto dos vereadores é de R$ 8.210, o quarto mais baixo das 12 câmaras da Região Metropolitana. Para o presidente, o valor é “razoável” para cobrir este tipo de despesa.
– Eu parto do princípio que o vereador de Esteio tem que estar em Esteio. Nunca viajei. Faço contato telefônico se preciso ver algum projeto no Ministério das Cidades, tento usar a mão de obra que já está lá. Não adianta um vereador dizer que foi a Brasília, aparecer na foto e não trazer nada de concreto – alega o vereador.
“Pega muito mal viajar tanto”
Marcelo afirma que a Câmara recebe muitas ofertas de cursos, mas, no entendimento dele, o papel do vereador exige que ele esteja mais presente na cidade. Além disso, a internet facilita o contato com agentes políticos de Brasília. Para o vereador, só vale o deslocamento quando há certeza de que ele trará benefícios para a cidade:
– Acho que pega muito mal viajar tanto. O vereador é o político mais presente junto à população. As soluções para o município estão dentro do próprio município. E a decisão de não viajar não traz prejuízos para os trabalhos da Câmara, pontua ele. Não impede o andamento da elaboração de projetos nem a votação dos que chegam da prefeitura.