Há exatamente um ano, quando avistou o helicóptero do Serviço Aeropolicial da Fronteira (Saer/Fron) que foi resgatar cinco pessoas da família Lauxen, ilhadas em cima de pés de cinamomo, no meio da água do rio Saudades, Oeste de SC, o menino Bruno Lauxen falou para o pai, Clairton:
– Pai, eu ainda vou jogar bola contigo naquele campo.
VÍDEO: Família é resgatada do topo de árvore em Saudades, no Oeste de SC
Cerca de 1 mil pessoas ficaram desalojadas em Coronel Freitas
O menino realizou o sonho. O campo está recuperado, a sede do camping da família foi reconstruída com um empréstimo a juro zero de uma cooperativa de crédito, a família recebeu uma casa da Defesa Civil do Estado e a mudança para a nova moradia só não foi feita porque Clairton está construindo quartos para acomodar os filhos.
– Hoje estou mais forte – disse Bruno, que não é uma criança de muitas palavras. Após o susto, ele ganhou duas camisas da Chapecoense e virou amigo do jogador Rafael Lima.
Chuva em SC: confirmadas duas mortes no Estado e 45 cidades são atingidas
Saudades, no Oeste, teve 30% da área urbana inundada por causa das chuvas
A casa foi construída num local mais alto que a antiga, que foi levada embora pelo rio, que transbordou. O tio Alexandre lembra que a correnteza formava ondas que pareciam o mar e o maior medo foi ser atingido por troncos e galhos.
No dia 14 de julho do ano passado, quando a água começou a subir, Clairton pediu ajuda aos irmãos Alexandre e Vanderlei e a cunhada, Janice. De repente, se viram ilhados e a salvação foram as árvores.
O bote dos bombeiros não conseguiu se aproximar para resgatá-los e, somente duas horas depois, o Saer chegou.
– O esqui do helicóptero enroscou num galho. É algo que vai ficar marcado para sempre – lembrou Clairton, que chega a se emocionar ao lembrar do episódio.
Clairton reclamou que o auxílio governamental não foi tanto, estimando que os gastos em viagens das autoridades foi maior dos que os recursos vindos para o município. Mesmo assim, ganhou a casa da Defesa Civil e também ajuda. Os tijolos para a ampliação do imóvel, por exemplo, vieram de um empresário de Chapecó. Além disso, móveis, roupas e eletrodomésticos chegaram à família por meio de doações. Alguns pertences foram resgatados, como geladeira, freezer e roupas, que estavam a 10 metros de altura, nas árvores.
O irmão, Vanderlei, e a cunhada, Janice, não gostam nem de comentar sobre o que viveram naquele dia 14 de julho. Mas Alexandre, o outro irmão de Clairton, encara a situação como uma nova oportunidade.
– A gente dá valor a tudo que reconstruiu – disse.
A família Lauxen estima ter perdido cerca de R$ 700 mil com a enxurrada. Mas Alexandre lembra que isso não valeria nada se tivessem perdido a vida, agora reconstruída, segundo ele, muito mais bonita.
Em Coronel Freitas, famílias ainda aguardam casas
O temporal de julho do ano passado atingiu 28,7 mil pessoas, em 68 municípios, sendo que desses, 32 tiveram situação de emergência reconhecida e dois, Saudades e Coronel Freitas, decreto de Estado de Calamidade Pública. Em Saudades, 20 casas foram destruídas e 11 delas já entregues, entre elas a da família Lauxen.
Em Coronel Freitas 27 casas foram levadas pela enxurrada e uma pessoa morreu. Seis famílias ainda aguardam as moradias da Defesa Civil.
A prefeitura comprou os terrenos e está fazendo a terraplenagem. De acordo com o coordenador regional da Defesa Civil, Clair Bazzi, a empresa responsável pela instalação das casas só está aguardando a liberação dos terrenos para instalar a estrutura, que tem cerca de 40 metros quadrados e custa R$ 48 mil cada.
A secretária de Administração e Finanças do município, Clarice Zucco, disse que houve uma demora porque o município aguardava recursos federais para a reconstrução das moradias e, como isso não ocorreu, a Defesa Civil do Estado assumiu a despesa.
Algumas famílias também não aceitaram o novo imóvel, por ser menor do que o destruído, e mais longe do Centro. O problema é que muitas delas moravam em áreas de preservação permanente, próximo a rios, onde a reconstrução não é permitida.
De acordo com o promotor de Justiça de Coronel Freitas, João Paulo de Andrade, muitas construções irregulares até contribuíram para reduzir o escoamento da água.
– As pessoas construíram em áreas de preservação que também são áreas de perigo – avaliou.
Por isso o Ministério Público solicitou ao município um estudo sócio-ambiental. A partir desse estudo será analisada a possibilidade de autorizar construções numa área de 15 a 30 metros dos rios, em área urbana, com baixo impacto ambiental. Esse estudo será encaminhado para o Conselho Superior do Ministério Público em Florianópolis na próxima semana.
A maioria das famílias aguarda essa análise para reconstruir dentro dessa faixa. No entanto, as construções terão que ser feitas com pilares e num nível acima do nível da enchente do ano passado.
O município de Coronel Freitas já adotou o desassoreamento dos rios Xaxim e Taquaruçu, que cortam a cidade, como medida de prevenção. A prefeitura também aguarda R$ 1,2 milhão para reconstrução de nove pontes. Segundo a secretária, o município gastou R$ 5 milhões na recuperação de ruas, estradas e prédios públicos.
A Defesa Civil do Estado informou que liberou R$ 82 mil para compra de combustível e R$ 181 mil para reconstrução de bueiros e galeria pluviais. Para Saudades, foram destinados R$ 92 mil em combustível e R$ 189 mil para recuperação de vias públicas.
O Ministério da Integração Nacional, por meio da Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil (Sedec), liberou R$ 537.284,01 para a reconstrução de pontes nos municípios de Coronel Freitas e Saudades, em Santa Catarina.
A Defesa Civil informou que até maio do ano que vem serão construídos Centros Regionais de Monitoramento e o Centro Integrado de Gestão de Riscos e Desastres, em Florianópolis, permitindo uma resposta mais rápida. Até lá também deve estar concluído o radar meteorológico do Oeste e os planos de contingência dos municípios.