As primeiras casas da olaria localizada em um terreno aos fundos da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), em Camobi, foram construídas há 50 anos. Na época, a empresa que administrava a fábrica de tijolos para a construção da instituição cedeu três moradias a famílias de funcionários que foram contratados.
Famílias de Santa Maria lutam para permanecer em áreas ocupadas
Hoje, 31 famílias vivem no local. As residências, no entanto, são consideradas irregulares pela Justiça, e as cerca de 105 pessoas que ali moram devem deixar suas casas. O prazo ainda não foi estabelecido, mas, há cerca de um mês, a energia elétrica foi cortada.
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Algemiro Alves Pereira, 84 anos, mudou-se para o local com a mulher, Anahyr Bastos Pereira, 85, e os filhos, em 1966, para trabalhar como queimador.
– Ninguém aqui invadiu. Eles nos deram as primeiras casas e vieram instalar a luz. Ninguém trouxe nenhum papel, não fomos notificados de nada. Ninguém vem aqui explicar o que está acontecendo – diz o idoso.
De acordo com o advogado que representa os moradores, Adir Luiz de Moraes, em 2010 a família de Algemiro ingressou na Justiça com uma ação de usucapião da área. No entanto, em 2014, o judiciário reconheceu o local como área federal e de posse da União. Em 2015, a UFSM entrou com o pedido de reintegração de posse. A Justiça decidiu, em última instância, que os moradores terão de deixar o local. Não cabe recurso.
Imbróglio judicial
A partir daí, por entender que a terra pertence ao governo federal, e atendendo a um pedido do MPF, instaurou-se procedimento junto à Polícia Federal de furto de energia elétrica. A procuradoria da UFSM justifica que tentou acordos extrajudiciais para que a questão fosse resolvida e a energia fosse paga pelos moradores, que nunca os teriam cumprido.
No acordo, ficou decidido que deveria ser instalada uma rede de energia própria para individualizar o consumo dos moradores. Como os medidores ainda não foram colocados, há exatos 30 dias uma equipe da PF esteve no local junto com representantes da universidade para cortar a luz. Desde então, as 31 famílias estão às escuras, tendo de dividir as despesas do aluguel de um gerador para poder manter os alimentos refrigerados.
O drama se agrava pelo fato de que muitos dos moradores dali são idosos, crianças ou pessoas com algum tipo de doença, como o aposentado Estanatiel Souza, 65 anos, que trabalhou na Olaria e na vigilância da instituição, que ele sofre com diabetes e psoríase. Por conta da falta de luz, os remédios dele, que precisam ser refrigerados, estragaram.
– Está sendo torturante, uma humilhação. Os idosos estão quase entrando em depressão, passam chorando. Na verdade, a gente tem uma vida aqui, eles vieram para trabalhar, nunca invadiram nada – alega a filha Marilei Souza, 34 anos.
Desocupação pode ser gradual
No dia 6 de julho, o advogado das famílias entrou com pedido na Justiça para o religamento da energia elétrica e o MPF deu o prazo de cinco dias úteis uma decisão.
– É desumana a situação que aquelas famílias estão submetidas. Há pessoas idosas, doentes. É uma questão humanitária. Muitos trabalharam na olaria à época da criação da UFSM, e essa mesma mão de obra serviu para fornecer os tijolos das construções da universidade – alega Adir Luiz de Moraes.
Em relação à reintegração de posse, o advogado afirma que não há mais a possibilidade de recorrer da decisão, mas, de acordo com ele, o MPF já teria intervido para viabilizar a desocupação de maneira menos traumática possível, com a possibilidade de destinar as famílias para áreas disponibilizadas pela prefeitura de Santa Maria.
– Não estamos diante de invasão recente. Essas famílias podem e devem ser acolhidas pelo poder público – afirma Moraes.